Dias atrás postei um texto sobre meu problema com o chuveiro de hotéis. Foi um texto postado diretamente de Anápolis, onde eu estava. Horas
depois, voltei para São Paulo. Avião lotado – e na hora do embarque ficamos
sabendo que era assento livre. Cumbica lotado. Ônibus de Cumbica até Congonhas
lotado.
É importante lembrar que as palavras “lotado” do parágrafo
acima não se referem à quantidade de pessoas, mas sim a de mal-educados. No
avião, a pessoa à minha frente deitou o encosto do banco assim que se sentou, praticamente
deitando a cabeça no meu colo. Estava quase perguntando se o sujeito queria um
cafuné quando ele foi obrigado a subir o banco para o avião decolar.
O avião estava a meio metro de altitude quando o sujeito
abaixou o banco de novo. O avião estava a cinco metros de altitude quando o
sujeito começou a dormir. O avião estava a dez metros de altitude quando o
sujeito começou a roncar. Foi assim até São Paulo – ou quase, já que sempre que
ele roncava mais alto eu enfiava o joelho no encosto.
Em Cumbica? Desci e fui quase pisoteado por uma família que
correu para entrar no ônibus que leva ao terminal, provavelmente para irem sentados.
No aeroporto, fui atropelado por três carrinhos de bagagem. No ônibus até Congonhas,
a menina à minha frente também deitou o banco, sendo que ela desceu na primeira
parada (Tietê), dez minutos depois. É muita vontade de descer o banco.
Assim, depois de passar três dias trabalhando muito,
dormindo pouco – e felizmente dando risadas com amigos que não via há muito
tempo – e três horas sendo esmagado, pisoteado, amassado, despertado,
empurrado, puxado, chutado e socado... Embarquei no táxi.
De Congonhas até minha casa daria coisa de dez minutos. Eram
dez minutos que eu queria apenas ficar sozinho, em silêncio. Talvez, como eu
adoro conversar com taxista, bater papo sobre a chuva, o frio que estava
fazendo, sobre “como tem gente a essa hora na rua”... Mais nada.
Mas não deu certo.
Entrei no táxi e o som estava no máximo. O Frejat estava
gritando alguma coisa sobre tudo o que ele oferecer é seu calor e seu endereço.
Pensei em comentar com o taxista que a essa hora da manhã, voltando de viagem,
ninguém tem um amor, grande amor, mas quando abri a boca o Frejat pediu para que
o grande amor durasse apenas o tempo que mereça. Com a cabeça doendo, eu
resmunguei um “puta que pariu, eu mereço” e o taxista deve ter achado que eu
estava cantando junto.
Finalmente o Frejat calou a boca, dando lugar aos primeiros
acordes de San Francisco (Be Sure to Wear Some Flowers in Your Hear) e nada do
taxista abaixar o som. Nada contra a música, Scott McKenzie, flower power e
tal... Mas às vezes a única música que a gente quer ouvir é o silêncio.
Assim, decidi começar a falar com o sujeito. Se ele não ouvisse
o que eu estava falando, ele seria obrigado a abaixar o som do rádio. Plano de
mestre.
Ou não, já que foi a pior decisão que tomei na vida.
Virei para ele e disse:
- Que horas começou a chover aqui?
- Olha, foi mais ou menos IF YOU’RE GOING TO SAN FRANCISCO ontem estava BE SURE TO WEAR SOME FLOWERS IN YOUR HAIR e agora está assim.
- Como?
- Ontem mesmo eu IF
YOU’RE GOING TO SAN FRANCISCO e aí eu fui YOU’RE GONNA MEET SOME GENTLE PEOPLE THERE nunca mais volto.
- Eu não entendi o que FOR
THOSE WHO COME TO SAN FRANCISCO
- E o mecânico que SUMMERTIME
WILL BE A LOVE-IN THERE para mim? Eu nem quis IN THE STREETS OF SAN FRANCISCO foi o que eu disse.
- Como é?
- Eu não sou bobo para GENTLE
PEOPLE WITH FLOWERS IN YOUR HAIR você não concorda?
- Eu não posso concordar, eu não estou ouvALL ACROSS THE NATION SUCH
- A STRANGE VIBRATION
porque PEOPLE IN MOTION tô errado?
- Será que não dá para THERE’S
A WHOLE GENERATION WITH A NEW EXPLANATIONosta de música hippie?
- Mecânico é MESMPEOPLE
IN MOTION PEOPLE IN MOTION. Sempre foi assim. Depois não sabe porque FOR THOSE WHO COME TO SAN FRANCISCO
preso.
- Quem está preso? Eu não Be Sure To Wear Some Flowers In Your Hair parar ali, naquele portão.
- Neste portãIF YOU
COME TO SAN FRANCISCO reais.
- Toma. Pode ficar com o trSUMMERTIME WILL BE A LOVE-IN THERE
- ObrigadVOCÊ ESTÁ OUVINDO A RÁDIO
Desci do carro até tonto, antes que a próxima música
começasse e entrei correndo em casa em busca de silêncio.
Mas como acredito que a gente aprende algo o tempo inteiro, desta vez aprendi que se você for para São Paulo, tenha a certeza de usar tampões de ouvido quando pegar o táxi no aeroporto.
Mas como acredito que a gente aprende algo o tempo inteiro, desta vez aprendi que se você for para São Paulo, tenha a certeza de usar tampões de ouvido quando pegar o táxi no aeroporto.
2 comentários:
...e usar flores no cabelo.
E mandar o taxista enfiar as flores e o rádio no AQUI É SÓ SUCESSO!
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