Arquivo da Polícia
Militar
Transcrição de Depoimento
Rob Gordon
31/12/2014
Transcrição de Depoimento
Rob Gordon
31/12/2014
Detetive Palhares:
Me conte o que você lembra. Desde o começo.
Rob Gordon: Eu
não sei. Eu estava em casa, mexendo no computador.
Detetive Palhares: Algo
específico?
Rob Gordon: Não.
Nada demais. Estava fazendo uns textos. E de repente...
Detetive Palhares: De
repente...?
Rob Gordon: Eu
não sei. Eu apaguei.
Detetive Palhares: Apagou?
Rob Gordon: Isso.
Ou algo parecido com isso. Porque de repente eu acordei e estava deitado no
quintal da minha casa. E não sei como cheguei até ali.
Detetive Palhares: Você
estava sozinho no quintal?
Rob Gordon: Sim.
Tinha apenas um balde ao meu lado. Um balde e uma pequena televisão.
Detetive Palhares: Uma
televisão?
Rob Gordon: Isso.
E assim que acordei a televisão se ligou sozinha.
Detetive Palhares: E
o que aconteceu então?
Rob Gordon: Tinha
algo na tela da TV. Não era um monstro, parecia ser uma máscara. Era como se
alguém estivesse usando uma máscara, toda branca mas com círculos vermelhos nas
bochechas.
Detetive Palhares: Parecido com este retrato falado? |
Rob Gordon: Isso!
Era a mesma máscara. Mas não era essa pessoa, eu acho. Dava para ver o cabelo
por trás da máscara. E eles eram loiros. Loiros e compridos. A pessoa era
loira. E ela... começou a falar comigo.
Detetive Palhares: O
que ela disse?
Rob Gordon: Ela disse
meu nome. Não lembro se foi “oi, Rob Gordon”, ou “boa tarde, Rob Gordon”. Mas
ela disse meu nome. E disse que queria jogar um jogo comigo.
Detetive Palhares: Um
jogo?
Rob Gordon: Isso.
Detetive Palhares: E
o que você disse?
Rob Gordon: Eu
disse que estou jogando Fallout New Vegas no PC, e que se ela quisesse a gente
poderia jogar junto.
Detetive Palhares: E
o que a pessoa da máscara respondeu?
Rob Gordon: Me
xingou de imbecil.
Detetive Palhares: E
então?
Rob Gordon: Então
ela disse que iríamos jogar outro jogo. Um jogo especial que ela havia
preparado.
Detetive Palhares: Como
assim?
Rob Gordon: Ela
disse que no dia seguinte haveria um churrasco na minha casa. E era verdade,
era o churrasco de final de ano. E sabia o quanto eu gostava de churrasco, mas queria
que eu provasse isso.
Detetive Palhares: Provasse?
Rob Gordon: Isso.
Ela queria ver se eu era capaz de transpirar toda a carne que iria comer. Ela
disse que eu passei uma existência inútil, indo de churrascaria em
churrascaria. E que é hora de começar a mostrar o meu valor. E queria ver a
minha vontade de comer churrasco.
Detetive Palhares: Como?
Rob Gordon: Foi o
que eu perguntei. E ela mandou olhar o balde. Tinha água com espuma. Era como
se fosse um sabão. E disse que se eu olhasse ao redor, iria encontrar uma
vassoura. E que eu apenas comeria o churrasco se transpirasse lavando o quintal
inteiro. Disse que eu só comeria o churrasco se soubesse dar valor para o
churrasco. E para a sujeira que ele faz no quintal.
Detetive Palhares: Você
pensou em recusar?
Rob Gordon: Sim.
Eu disse que não iria lavar nada, que era melhor me soltar.
Detetive Palhares: E
então?
Rob Gordon: A
pessoa com a máscara ficou me olhando pela televisão... Ela me via ali, eu
procurei câmeras mas não achei. E disse que se eu me recusasse, eu iria comer
apenas...
Detetive Palhares: Comer
apenas...?
Rob Gordon: É
difícil...
Detetive Palhares: Por
favor, precisamos do seu depoimento.
Rob Gordon: Desculpe...
Rúcula. Ela disse que eu iria comer apenas rúcula. E sem tempero! No Ano Novo!
Disse que a escolha era minha. Vida ou morte.
Detetive Palhares: Vida
ou morte? Ela iria matar você?
Rob Gordon: Sim,
eu perguntei por que ela estava falando de vida ou morte. E ela respondeu “linguiça
ou agrião, cerveja ou suco verde, picanha ou tomatinhos, vida ou morte. É tudo
a mesma coisa. Faça sua escolha”. Foi horrível.
Detetive Palhares: E
o que você fez?
Rob Gordon: O que
você faria? Eu levantei e comecei a esfregar o quintal! Era meu churrasco que
estava em jogo!
Detetive Palhares: E
você lavou o quintal inteiro?
Rob Gordon: Mais
ou menos. De repente, minhas costas começaram a doer. Eu esfregava com a vassoura,
e quando parava para descansar, descobria que não conseguia mais ficar com a
coluna reta. A dor... A dor era demais... Às vezes eu caía no chão gemendo de
dor, e não conseguia me mover.
Detetive Palhares: Entendo.
Rob Gordon: E o
suor... Eu transpirava mais que em qualquer outro dia da minha vida. A dor, o
suor...
Detetive Palhares: Você
não pensou em parar?
Rob Gordon: Sim.
Mas toda vez que eu parava, a pessoa com a máscara aparecia na televisão e
dizia que “você lavou o suficiente para lamber um pedaço de fraldinha”, ou “você
se esforçou, poderá cheirar uma linguiça”. E eu ficava aterrorizado e começava
a lavar de novo, gemendo de dor nas costas.
Detetive Palhares: Você
estava sozinho?
Rob Gordon: Sim. No
começo, sim. Mas depois os gatos da vizinhança foram até o muro observar tudo.
Foi humilhante demais. Minhas costas... Minhas costas doíam muito. E o sabão
não era bom, eu tinha que esfregar cada pedaço do quintal três ou quatro vezes.
E não podia usar muita água.
Detetive Palhares: E
o que aconteceu então?
Rob Gordon: Eu
lavei o quintal inteiro. Não ficou muito bom, mas consegui lavar inteiro. E me
ajoelhei na frente da televisão e disse que havia feito o que ela havia pedido.
Eu queria ir embora. Eu queria ir para dentro de casa, tomar uma cerveja.
Detetive Palhares: E
a televisão respondeu?
Rob Gordon: Sim.
Disse que eu havia cumprido minha parte no acordo. E que eu estava livre.
Detetive Palhares: E
o churrasco?
Rob Gordon: Ela
não disse nada. Eu devo ter apagado novamente porque acordei no meio da rua.
Detetive Palhares: Na
rua?
Rob Gordon: Isso.
Na frente de um mercado. E tinha um gravador no meu bolso.
Detetive Palhares: Um
gravador?
Rob Gordon: Isso,
um pequeno gravador com uma fita K7.
Detetive Palhares: Você
tocou a fita?
Rob Gordon: Sim.
Era a mesma voz. Dizia que eu devia comprar coisas no mercado para o churrasco.
Detetive Palhares: Que
coisas?
Rob Gordon: Rúcula.
Alface. Cenoura. Agrião.
Detetive Palhares: Entendo.
Rob Gordon: Acelga!
Ela queria que eu comprasse essas coisas! No Ano Novo! Você consegue imaginar uma
crueldade como essa?
Detetive Palhares: Foi
por isso que você começou a destruir as prateleiras de vegetais e as de
produtos de limpeza do mercado?
Rob Gordon: Sim.
Eu estava fora de mim.
Detetive Palhares: Entendo.
Muito obrigado pelo seu depoimento, Sr. Gordon. Uma viatura vai acompanhá-lo
até em casa. Se precisarmos de mais informações, entraremos em contato.
Rob Gordon: Não
tem como a viatura parar numa churrascaria?
Detetive Palhares: Infelizmente
não. Podem levá-lo.
Rob Gordon: Eu
pago! Avisa o cara da viatura que eu pago! Eu preciso só de um pedacinho de
cupim! Só um!
Um comentário:
Adorei o texto! Ri muito!
Feliz ano novo, Rob!
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