13 de janeiro de 2014

2014 - Uma Odisséia no MIS

Após um breve período de férias, este blog retorna com o pé direito falando de Stanley Kubrick.

Isso porque por motivos de tempo eu e a Esposa deixamos para conferir a exposição sobre ele, no MIS, somente nos últimos dias, e qualquer pessoa que acompanha o assunto sabe (ou que conhece um pouco o Brasil) poderia imaginar que estava lotada. Assim, nós e mais dois amigos fomos até lá no sábado à noite, dispostos a encarar a fila – algo muito mais fácil de fazer quando se está acompanhado.

Confesso que a fila estava grande, mas menor do que eu imaginava. Ela dobrava se estendia pela calçada do MIS, dobrava a esquina e... E mais nada. Quando eu vi que ela virava a esquina, imaginei que estivesse indo até Jundiaí, mas não, era apenas aquilo mesmo. Virava a esquina, meia dúzia de pessoas...

E o japonês.

O japonês era um funcionário do MIS que, provavelmente por não ter muito prestígio entre os colegas, ficou incumbido de cuidar do final do fila, o que não deve ser exatamente um cargo muito desejado entre os funcionários do museu. E talvez seja por causa disso que o sujeito decidiu que aquela situação era perfeita para começar a praticar terrorismo com os visitantes.

Paramos no final da fila e ele veio falar conosco.

- Vocês vieram ver a exposição do Kubrick?

Que tipo de pergunta era essa? Pensei em responder que “não, nós ouvimos falar tanto sobre a fila que viemos só conferir de perto, como a cidade inteira estão falando da fila a gente acha que deve ser mais legal que a exposição”, mas deixei quieto.

- Sim.

- Tem que ver se vocês vão conseguir entrar...

- Como assim? Hoje não vai até três da manhã?

- Sim.

- São dez horas!

- É, mas está demorando... Vocês estão aqui e para a fila andar até a porta do MIS, vai demorar umas... Deixa ver... Umas quatro horas.

- Oi?

- Umas quatro horas.

- Quatro horas? A exposição exibe todos os filmes dele na íntegra?

- Não, mas está demorando. Olhe, umas três horas, no mínimo. Isso, com sorte. Vai demorar pelo menos umas quatro.

- Ok. Nós vamos arriscar assim mesmo.

- As pessoas que entrarem atrás de vocês não vão conseguir assistir. Não vai dar tempo.

- Bom, mas as pessoas que entrarem atrás de mim na fila não estão comigo. Logo, elas são problema seu, não meu.

- É, eu vou ficar aqui avisando.

- Certo. 

Meia hora depois, eu nem via mais o japonês. A fila já tinha andando metros e mais metros, e tinha tanta gente atrás de mim que o japonês havia desaparecido. Provavelmente, continuava ali no final da fila, tentando convencer as pessoas de que não vai dar tempo, que demora demais, que não vai dar certo, que não devíamos ter saído de casa, que vamos embora daqui Lippy (hardy har-har mode: on).

A fila continuava andando. Quando nos aproximamos do MIS, pouco mais de uma hora depois, passaram umas meninas distribuindo adesivos. Teoricamente, sem o adesivo na camiseta você não entrava na exposição.

Algo me disse que era uma armadilha. Algo me disse que era um truque do japonês.

Começou com a forja dos grandes adesivos. Três mil foram dados aos fãs de Kubrick, sábios e conscientes que ele fez algo além de O Iluminado e Laranja Mecânica. Sete mil foram entregues aos fãs de cinema, que queriam saber mais o cineasta. E nove mil, nove mil foram entregues aos hipsters, que desejavam, acima de tudo, ficar dando check-in e postando fotos da fila no Instagram, usando a tag #Shining”.

Mas todos eles foram enganados...

“No final da fila, o lorde japonês do MIS forjou, em segredo, um adesivo mestre para controlar todos os outros. E, neste adesivo, ele colocou toda sua preguiça e vontade de ir para casa.

Um adesivo para controlar a todos.”

Duas horas depois, entrávamos na exposição e deixamos para trás o japonês e seus planos de conquistar a Terra-Média com adesivos.

Não vou me alongar muito sobre a exposição aqui. Kubrick é um diretor que sou fã desde moleque: eu devia ter uns oito anos quando assisti a 2001 com meu pai e, mesmo sem entender nada, fiquei meio maravilhado com o filme. Então, para mim, foi algo meio mágico.

Só não foi perfeita porque o monolito não gritava quando você chegava perto.

Mas claro que vale citar alguns destaques, como os ambientes de 2001 e Glória Feita de Sangue, e objetos que eu nunca achei que fosse ver na vida, como o convite para a première de Dr. Fantástico que foi cancelada por causa do assassinado de Kennedy e a roupa de Crassus em Spartacus – que você olha e pensa “porra, o Laurence Olivier vestiu isso”. E o xadrez do Kubrick. E o roteiro anotado de Lolita.

Laurence Olivier esteve aqui.

Não, a exposição não tem destaques. Tudo é um enorme destaque.

A não ser, claro, os destaques negativos. Mas estes não são culpa do Kubrick.

Por exemplo, o Kubrick não teria culpa de que o casal de hipsters que cismava em furar a fila dentro das salas nunca foi jogado no labirinto do Hotel Overlook; o Kubrick não teria culpa de que as pessoas que roubaram duas pastas com réplicas de documentos que podiam ser folheadas (não lembro os filmes) nunca foram obrigadas a duelar entre si, como em Barry Lyndon.

E o Kubrick não tem culpa do babaca que estava com a gente na sala de O Iluminado.

Eu sabia que isso ia acontecer. Eu sabia que teria um babaca dentro da sala de O Iluminado – e se não estivesse dentro da sala de O Iluminado, estaria na sala de Laranja Mecânica. Tenho certeza de que a cada leva de pessoas que entrou em uma destas duas salas, em todos os dias da exposição, contava com um babaca. Na minha turma, o babaca estava na sala de O Iluminado.

Explico melhor: o ambiente de O Iluminado era formado por corredores imitando o hojel Overlook, com os materiais expostos em “portas dos quartos” que abriam e fechavam. E claro que o babaca da minha vez queria porque queria tirar uma foto atrás de uma porta – deve ter pisado numa página original do roteiro para isso – com a cara no vão da porta e expressão de ódio, imitando o famoso “Heeeeere’s Johnny” do filme.

Todo mundo parado, esperando, até ele tirar a foto. E minha vontade era dizer que “esta cena não acontece na porta de um dos quartos dos hóspedes, vá tirar sua foto em outro lugar”, ou “é uma exposição, não uma obra interativa, vá procurar as pessoas da sua idade”. Ou até mesmo ficar parado ao lado da porta e, quando ele colocasse a cara para tirar a foto, gritar um “Heeeeere’s Tonto!”

Mas não, não fiz nada – e olha que na mesma sala tinha um machado e um facão dando sopa ali. Apenas pensei na forma que algumas pessoas se comportam em exposições e jurei para mim mesmo que, se um dia fizerem uma exposição do Lars von Trier, eu tenho muita pena de quem entrar na sala do Ninfomaníaca junto com esse cara.

Mas isso não atrapalhou o programa como um todo. Como eu disse, saí de lá maravilhado e dando risada, ainda mais depois que vi que eram duas da manhã e dezenas de pessoas ainda estavam na fila – todas elas devidamente adesivadas – ou seja, o Um Adesivo não funcionou direito – para desespero do japonês terrorista do final da fila.

Chupa, japonês.

E, para matar a saudade, vamos fazer um Top 5 Stanley Kubrick, que é uma tarefa bem difícil:

1. 2001 - Uma Odisséia no Espaço: É o melhor filme de ficção científica da história. Não é preciso dizer mais nada.
2. Laranja Mecânica: É tão bom que nem mesmo os fãs intelecutalóides conseguiram estragar.
3. Glória Feita de Sangue: O cinema tem poucos filmes sobre a I Guerra Mundial. Talvez porque Kubrick tenha conseguido mostrar toda a boçalidade da guerra em um único filme.
4. O Iluminado: Seria só um filme de terror sobre um hotel assombrado, mas tem Kubrick. Tem Nicholson. Tem Stephen King. Ou seja, não tem como dar errado.
5. Dr. Fantástico: Kubrick no auge da forma, humor negro e Peter Sellers íncontrolável? Perfeito.

3 comentários:

Elise disse...

É, eu acabei não indo. Demorei demais pra ir, e acabou que pro último final de semana não deu certo porque tenho problemas pra acordar cedo e tenho problemas com sol forte e tenho problemas com estar fora de casa ou da casa de alguém depois que escurece. Mas vá lá, até hoje eu só assisti Laranja Mecânica e De olhos bem fechados [esse conta?], então a falha não foi tão grande assim.

Mas eu vou na do Bowie. De manhã. Ah, se vou...

Vinicius Fagundes disse...

Meu top 5 do Kubrick:
1. Laranja Mecânica;
2. Nascido Para Matar;
3. Dr. Fantástico;
4. O Grande Golpe;
5. Lolita.

Pri disse...

Ahhhh Rob, fiquei com dó do japonês!
Quando fui, 1 semana antes, ele avisou q iria demorar uma hora e meia mais ou menos, sendo que a fila estava muito menor q desse sábado (sim, eu tentei ir de novo), no fim das contas demorou quase 2h e meia!

Mas certamente valeu a pena. ^^