7 de dezembro de 2013

A Fronteira Final



Foi agora, em uma Casa do Pão de Queijo aqui ao lado de casa.

Estava tomando café com a Esposa, sentado numa mesa do canto. Ao nosso lado, uma enorme janela separa a Casa do Pão de Queijo das mesas ao lado da fora – é uma espécie de centro comercial, com vários restaurantes.

Enfim, estávamos no café, ao lado do vidro.

Foi quando ouvi uma pancada no vidro. Bem ao meu lado. Olhei e vi um menino. Era negro e devia ter uns três anos. Levantei os olhos e vi a mãe dele sentada numa mesa do lado de fora, observando tudo.

Ele bateu no vidro, e eu bati no vidro. Ele colocou a mão no vidro, eu coloquei a mão no vidro. Ele tirou a mão do vidro, eu tirei a mão do vidro. Ele colou o nariz no vidro. Eu colei o nariz no vidro. Ele fez careta. Eu fiz careta. Ele tirou o nariz do vidro. Eu tirei o nariz do vidro.

Foi quando ele colocou a mão, aberta, no vidro. Eu coloquei a mão também aberta, no vidro, exatamente sobre a mão dele.

Estávamos nós dois ali. Com as mãos quase encostadas, mas sem tocarmos um no outro. O vidro nos separava.

Ele olhou para mim. Eu olhei para ele.

Eu respirei fundo e disse:

- I have been... And always shall be… Your friend.

O menino sorriu. Nossas mãos continuavam quase coladas. Eu continuei:

- Live long... and prosper.

Ele abriu um sorriso e tirou a mão do vidro. E correu de volta para a mãe. Mas ele não gritou “Khaaaaaaaaaan!”, nem se sentiu velho, nem prestou homenagens ao camarada morto.



Aliás, ele não fez nada sequer parecido com isso. Apenas gargalhou e abraçou a perna da mãe, que havia terminado seu café e estava se levantando. Foi embora, seguir sua vida – que, aposto, será longa e próspera.

Eu também não caí morto ao lado de um reator. Apenas terminei meu café.

E fiquei pensando. Você sabe que se tornou adulto ao deixar que outra pessoa seja o Capitão Kirk quando brinca de Jornada nas Estrelas. Mas isso não se trata de nenhuma fronteira final ou de uma terra desconhecida. Pois, quando “brincar de Jornada nas Estrelas” é um dos pontos altos do seu dia, você sabe que não é porque você se transformou em um adulto que você precisa necessariamente deixar de ser criança.

Sorri.

E, em algum lugar do passado, a criança que eu fui – e que sempre foi e sempre será minha amiga – sorriu junto comigo, vendo que sua missão estava cumprida. E deu o comando:

- Senhor Sulu, nos leve para casa.

7 comentários:

Ana Savini disse...

Foi engraçado. E muito fofo. hahahaha <3

Elise disse...

Que coisa fofa! =)

Eu já cumprimentei ao modo vulcano um amigo que estava com uma blusa azul com a insígnia da Frota Estelar e vivo olhando pro meu namorado e dizendo "beam me up, Scotty" (porque eu acho parecido com o Simon Pegg =P). Essas coisas deixam o dia leve, né?

Anônimo disse...

Eu penso exatamente como vc, Rob...
A gente sempre mantém uma criança dentro e procura algo que a nutra, às vezes mandando coisas boas e felizes, às vezes rindo de uma bobeira que vemos outras crianças fazerem, às vezes usando algo de nossas memórias de mais jovens pra trazer algo bonito.

O que fazemos com esta criança interior é um mistério... O mesmo mistério que nos leva, sempre, rumo à Fronteira Final ;)

Vida longa e próspera!

Diego disse...

Mr Sulu, second star to the right and straight on till morning!

Marco disse...

é pra ganhar o dia...gostei do paralelo...parabéns.

K.P. disse...

Ponto alto da minha manhã foi esse seu texto, Rob. Lindo. <3

Fernanda disse...

Que fofo, Rob!