15 de abril de 2010

Uma Vida em Copas - Introdução

Copa do Mundo.

Só o nome já mexe comigo. Demais. Copas do Mundo são tão importantes para mim que me arrisco a dizer que gosto mais delas do que de futebol em geral. O que, convenhamos, não é exatamente difícil. Claro que sou apaixonado pelo meu time, mas quem gosta de futebol sabe o quanto é incômodo ligar a televisão e assistir a um São Bento X Guarani quando uma Copa do Mundo está surgindo no horizonte.

Na verdade, eu me arrisco a dizer aqui que futebol e Copa do Mundo são coisas diferentes. Copa do Mundo é algo muito maior que simplesmente um campeonato de futebol. Gols, defesas e lances de Copa são lembrados e discutidos por anos, décadas até, em mesas de bar e programas de televisão. São momentos que entram para a história (não para a história do esporte, mas sim como marcos de uma época).

Por exemplo, eu ainda coloco o drible de corpo do Pelé sobre o goleiro uruguaio Mazurkiewicz, na Copa de 70, como uma das maiores realizações da raça humana. Sim, o gol do Rei sobre o Mão de Onça foi muito, muito mais bonito. Mas o drible sobre o arqueiro uruguaio não aconteceu num Campeonato Paulista, mas numa semifinal de Copa.

Campeonatos de futebol possuem jogadores e atletas.

Já Copas do Mundo possuem heróis e vilões. Copas do Mundo possuem mitos.

Talvez o meu modo de encarar as Copas do Mundo seja herança direta do meu pai.

Os jogadores do tricampeonato brasileiro são, talvez, os maiores heróis do meu pai. Ele sabe as escalações, os nomes completos, quem jogava em qual time. Alguns jogos – não apenas de Copa – ele consegue se lembrar até mesmo da data. Beira o autismo. E isso não porque ele leu ou decorou, mas porque sua vida foi marcada por estes eventos.

Não era difícil, na minha adolescência, eu e meus amigos ficarmos horas na sala da minha casa, escutando, maravilhados, enquanto ele contava histórias sobre jogos, dribles e gols, que, na voz dele, se transformavam em duelos inesquecíveis, truques mágicos e conquistas heróicas. Assim, graças a ele, cresci assistindo, dentro da minha mente, os dribles desconcertantes de Garrincha no meio de soviéticos gigantescos, a bomba de Carlos Alberto que jogou a pá de cal no túmulo italiano, as arrancadas de Jairzinho pelos gramados mexicanos ou os carrinhos inconseqüentes de Vavá na pequena área sueca.

Qualquer criança que passasse a infância ouvindo sobre isso certamente se interessaria pelo assunto. Mas uma criança que passasse a infância ouvindo essas histórias narradas com a paixão do meu pai, certamente se apaixonaria também.

Foi o que aconteceu comigo. Tornei-me um obcecado pelo assunto. Não um estudioso que coleciona estatísticas ou que decora resultados. Sim, eu sei todos os campeões e todos os países-sede de cor e salteado, e, se eu estiver inspirado (ou bêbado) o suficiente, consigo recitar os vice-campeões também. E, claro, sei os resultados de alguns jogos. Mas não consigo, por exemplo, recitar a escalação da Espanha de 1986, ou me lembrar de cabeça quais foram todos os jogos das oitavas de final de 1994.

Minha obsessão com a Copa é puramente emocional.

A cada quatro anos, existe um mês, um único mês, em que eu abandono todos os meus heróis, sejam eles dos cinemas, da música, ou dos quadrinhos, e venero somente aqueles poucos heróis (e odeio com esta mesma intensidade alguns dos vilões) que correm por aquele gramado. Entrego minha felicidade a eles e, justamente na busca por esta felicidade, choro, rio, faço promessas, tenho superstições, abraços pessoas que acabei de conhecer e grito. Grito com força, tudo aquilo que esperei quatro anos para gritar.

Ao mesmo tempo, acompanho todos os jogos, anoto resultados em tabelas, faço projeções e adivinhações, estudo escalações, táticas e revejo gols, sabendo que tive a sorte de assistir a lances que pessoas que serão lembrados daqui a muito, muito tempo.

A cada quatro anos, existe um mês, um único mês em que nada mais existe para mim.

Talvez seja por isso que as Copas do Mundo sejam tão marcantes na minha vida. Não me lembro com exatidão de todos os lances de todas as Copas que vi (o que é contraditório, já que sei de cor muitas jogadas de Copas que não assisti), mas me lembro com perfeição da pessoa que eu era e o que eu estava vivendo em cada uma destas Copas. E, acreditem, a cada quatro anos, muita coisa muda na sua vida.

Assim, de hoje até a o início da Copa, em 11 de junho, vou realizar um sonho antigo, e tentar contar a história da minha vida de uma forma diferente, abordando cada um dos torneios mundiais que vi. Cada Copa num post diferente, que não terão data específica para publicação e serão intercalados com os posts habituais.

Alguns serão mais leves. Outros mais tristes. Alguns poderão ter momentos engraçados, outros podem fazer alguém mais desavisado se descobrir com os olhos cheios de lágrimas.

Afinal, as Copas do Mundo são exatamente assim.

E a vida também.


(Próximo texto: Argentina – 1978)

16 comentários:

Tyler Bazz disse...

Como eu já disse, tá do caralho!
To ansioso pra ver a série toda...

E não lembro tooooodos os vices, mas boa parte deles.


Agora, não sabe a escalação da Espanha de 86????? Milton Neves te despreza.

Pedro Lucas Rocha Cabral de Vasconcellos disse...

Porra Rob, não saber a escalação da Espanha de 86 é grave!!! hahahahah

Já vi que vou me amarrar nessa série de posts!!

Uma das minhas maiores decepções da vida foi não ter visto a Hungria de 54, nem os Brasis de 70 e 82...

Anônimo disse...

Sensacional! Desconfiaria se tudo isso tivesse saido da cabeça de outra pessoa, mas se tratando de Rob eu acredito.

É verdade que a cada 4 anos muita coisa muda, viramos outras pessoas. Então mostra esse Robs pra gente :)

littlemarininha disse...

O juiz apitou, a partida teve início e os primeiro toque de bola foi incrível. Aguardo ansiosamente na arquibancada o desenrolar desse jogo. Ideia incrível, Rob! Ou melhor, bela jogada! ;)

Anônimo disse...

Espanha de 86....vou começar te dando uma dica, Butragueño,.....

Mari Hauer disse...

Eu queria ser tão organizada quanto vc: deixar pra ter marcos a cada quatro anos! Na verdade, nunca parei pra pensar nisso... Mas a ideia é boa!

Curiosa pra ler os próximos! :)

Varotto disse...

Já vi tudo! Agora vai sonhar com a seleção da copa de 82 dizendo pra você se livrar da lasanha antes que o Paolo Rossi chegue...

Varotto disse...

Ou qualquer coisa mais ou menos assim...

Lucas Casasco disse...

Muito bom, muito bom mesmo!
Agora fiquei ansioso pra ler as continuações...

Kel Sodre disse...

Nem tenho um comentário pertinente e contundente pra fazer a respeito do assunto porque sou menina e não gosto de futebo. Mas até eu que não ligo pra futebo gosto de Copa do Mundo. :-)

Bia Nascimento disse...

Sensacional Rob!!!
Eu tb tenho uma relação especial com a Copa por causa do meu pai, que era fanático tb. A Copa do nosso Penta foi emocionante, a de 94 marcou minha infância com o Tetra e a última foi péssima pelo Brasil ter perdido e por eu ter perdido meu pai uns dias antes de começar.... Cada uma tem uma história!!

To ansiosa pelos seus posts!!!

José A. Soares disse...

Já sou um dos desavisados! Lágrimas por aqui...

Jullia A. disse...

R'a! Eu vou assistir ao vivo uma quarta de final em cape town!

Pulo no Escuro disse...

Ai ai, se eu gostasse só um pouquinho de futebol... =/

Dani Cavalheiro disse...

Lá vem a Copa, aiaiai

Um mês, só um mês, que muda a vida da gente. Só quem ama futebol é que entende isso.

Besos

Unknown disse...

Copa como não amá-las...adorei ouvia o mesmo do meu pai, acho que isso define a paixão! Muito bom mesmo