Uma das coisas que eu mais aprecio nos lugares que freqüento é o fato de os garçons me conhecerem. Alguns garçons da Bovinu’s ali da Rebouças, por exemplo, sabem até a ordem que eu gosto de comer as carnes. Já no Oregon, os atendentes sabem que, toda vez que eu colocar o pé ali dentro, as chances de eu comer um X-salada bacon com tomate verde são bem grandes – aliás, as chances de eu ser chamado de estranho por alguém que estiver comigo graças ao “tomate verde” são maiores, mas isso não vem ao caso.
Esse reconhecimento dos garçons transmite não apenas segurança, mas um sentimento de que você é especial. Ou, pelo menos, mais especial que o casal sentado na mesa ao lado e que teve que pedir normalmente, sem ouvir um reconfortante “o de sempre, Sr. Gordon?”. Sempre gostei disso. E isso é difícil de ser conquistado, já que implica em você a) freqüentar o lugar com regularidade; b) ser simpático com os garçons e os maitres, sabendo, de preferência, o time de pelo menos três deles; e c) colocar providencialmente uma nota de 50 paus no bolso de um gerente no final do ano. E, cá entre nós, eu sou bom nisso – especialmente nos dois primeiros, já que não é sempre que um jornalista tem 50 paus assim.
Porém, por mais que eu tente, eu não consigo ser tratado assim de forma alguma na padaria que eu freqüento (sim, aquela das carolinas). Na verdade, até consigo, por um dos funcionários, que me reconhece, sabe o que eu bebo e costumo comer. O problema é o outro garçom, o Bigode. E não é má vontade dele. O fato é que para a) reconhecer uma pessoa; b) saber quando ela está sendo simpática; e c) entender que está sendo subornado é necessário um item indispensável: um cérebro. E o Bigode certamente carece disso.
Ou seja: toda vez que eu entro na padaria é ele quem está atendendo, sei que vou passar mais tempo tentando explicar meu pedido do que comendo. E meus pedidos não são esdrúxulos (ok, o tomate verde no Oregon é estranho, mas é fácil de ser compreendido). Agora, se eu pedir uma água para o Bigode, ele vai fazer nove perguntas a respeito da água (todas elas desnecessárias) e trazer um sorvete. Eu lembro a primeira vez que eu pedi uma omelete a ele. Lá, eles têm uma maravilha chamada omelete tudo, que têm queijo, ervilha, bacon, presunto e cebola. Quando eu descobri isso, decidi que aquilo havia sido feito para mim, e só precisava de uns ajustes. O problema é que os ajustes seriam feitos pelo Bigode.
– Bigode, eu quero um omelete tudo, mas sem ervilha nem queijo. E com bastante bacon.
Ele começou a anotar no bloquinho dele, falando em voz alta.
– Sem-er-vi-lha... Sem-quei-jo.... Sem-ba-con...
– Não, com bacon. Com muito bacon.
– E muito queijo?
– Não. Sem queijo.
– Então você não quer queijo?
– Isso. E quero muito bacon.
– E a ervilha?
– Também não quero ervilha.
– Então você quer uma omelete tudo, mas sem ervilha e queijo?
– E com muito bacon.
– Então não é uma omelete tudo.
Admito que a lógica dele, nessa colocação, foi brilhante.
– Bigode, esquece o nome. Deixa o "tudo" de lado. Eu quero uma omelete com muito bacon, cebola e presunto. Mais nada.
– Você não quer a ervilha?
– Não.
– E o queijo?
– Não.
– Mas o ovo você quer?
– Bom, é uma omelete. Não é questão de eu querer o ovo ou não. O ovo não é negociável numa omelete, certo?
Ele rabiscou tudo e começou a escrever novamente.
– O-me-le-te... Bas-tan-te-ba-con... Ce-bo-la... Er-vi-lha...
– Não, não é ervilha. É presunto!
– Pre-sun-to.
– Tire a ervilha. Risque a ervilha do pedido.
Ele rabiscou algo e me mostrou o bloco.
– É isso que você quer?
Eu nunca havia visto um garçom mostrar o bloco de pedidos a alguém. Sempre achei que aquilo fosse algo particular, que somente os garçons teriam direito a ler. Existe uma linha que separa os garçons dos clientes, e não é a gravata borboleta, é o bloquinho. Quando você entra num restaurante, o bloquinho é o modo usado pelos garçons para mostrarem que “você está apenas comendo aqui; eu faço o restaurante funcionar. Sem eu e meu bloco, você não é nada”. E nós, mortais, não temos direito a ver o bloquinho, seria uma heresia tão grande como você se infiltrar em uma seita proibida e secreta para assistir a um culto.
O Bigode, porém, dinamitou o muro que separava os clientes e os garçons há séculos, e, promovendo a união entre as duas classes, me mostrou o bloquinho dele. Mas, antes que algum garçom leia isso e decida que agora eu devo morrer para não espalhar os segredos que aquele artefato guardava, devo dizer aqui que não entendi porra nenhuma do que estava escrito.
(continua...)
21 comentários:
poo Rob.. Mó tempao sem postar em...
então.. eu acho que os garçons tem uma lingua só deles... tipo.. garçoneis ou sei la o que...
qndo tento ver esse bloquinho nunca entendo o que esta escrito..
Rob, acho que essa coisa do bloquinho se aplica mais no caso dos jornalistas, acho que vc se deixou contaminar pela sua pratica. Alias, ODEIO que pecam para ver meu bloquinho. Esta me chamando de incapaz?
Fiquei com vontade de comer omelete. Mas um omelete, nao uma. Mesmo que esteja errado, acho mais apropriado. Hahaha
Beijos.
Olá, vi seu blog no orkut vim visitar para poder comentar.
Seu blog é muito bom.
Aproveito para convidar que visite meu blog.
esse humor é muito bom!
hahahaha
textos em partes lembram tanto folhetim romântico, não?
Rob, como assim SEM QUEIJO?!
Vou guardar qualquer comentário que eu tenha para o final dessa saga.
[obviamente essa é uma desculpa extremamente esfarrapada para me desviar do fato de que hoje estou sem inspiração para comentar]
Não!!!!! Como você pode viciar as pessoas e não suprir o vicio?
9:19 PM
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depois da morte estúpida, nada como o Bigode pra descontrair.
:)
aguardando o restante da saga....
Hiauehauiehuieahea... eu tenho curiosidade de olhar os bloquinhos dos garçons!
Esse negócio de ser conhecido e já saberem suas preferências, fez com que eu lembrasse dos tempos de universidade. Quando eu e mais uns 2 ou 3 amigos saíamos mais cedo nas aulas da sexta-feira (estudávamos à noite) e o professor, muito amigo nosso, soltava a delicadeza: "Já vão encher a cara de novo, não é, bando de cachaceiros?", ao que nós sempre respondíamos: "De novo, não, professor. Ontem, nós não bebemos!"... Incrível como ele poderia saber disso só por deduções!
Quanto ao bloquinho do garçom, é verdade, trata-se de um verdadeiro segredo milenar, nuna vi um... e olha que garçom e bar, eu já vi muitos nos tempos de solteiro. hehehe...
Valeu.
Putz... sem queijo, sem ervilha... e com CEBOLA???
pode jogar fora...
deixa o pedido de lado...
cebola foi a pior coisa que
a humanidade decidiu chamar de tempero.
Deus criou para ser ervadaninha... mas os homens não entenderam e resolveram comer.
Mas você conseguiu comer o omelete ou foi embora? xD
A ervilha eu até entendo você tirar... mas o queijo? Poxa, logo o QUEIJO?
E deixar cebola? Saudável demais pro meu gosto.
Estou decepcionado =]
Que bom que você não entendeu por que seu pedido foi um tanto quanto exótico, hein? Tira aí o omelete e pede um sanduíche de bacon, presunto e ovo, assumindo que você não quer queijo. Risos.
Beijo meu.
Ps: ei, adicionei você no last.fm, me aceita lá? :)
Taquioparil, Rob, lá vai você enrolar cozinhar seus leitores em banho-maria com esse complexo de Star Wars que você tem. Custa fazer publicar volumes definitivos?
Ah, saco, e eu sempre volto!
casa101.blogspot.com
"E meus pedidos não são esdrúxulos..."
Desde quando omelete sem queijo NÃO é esdrúxulo??
Esse bigode nao era o Erick Idle disfaçado nao, né? q papo mais Monty Phyton vc tiveram.
HAUUHAUHAHUAHUA... e omelete sem queijo é ovo batido cara!
Hauahuahua, que blog legal! Cada história mais complexa que a outra.
Excelente Blogagem!
kkkkkkkkkkk
cara eu invejo a forma descontraída e natural de como você narra situações cotidianas, queria ser igual a você quando crescer... ops.. já cresci né... quem sabe na próxima então..rsrs
bjos
vai ver foi por isso q ele lhe mostrou o blokinho, por saber q vc não ia entender nada...
hehehe
odeio ervilhas - nem sei pq disse isso, não era isso o q eu ia falar...
mas sempre fujo de bigodudos...
- mas eu gosto de sopa de ervilha, e de creme tbm... ok, despreze esta parte tbm...
e no máximo, o meu pai é qm sabe qual é o meu de sempre...
ki privilégio...
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