9 de abril de 2010

Rob Gordon X Mexericas

Se os cinco sentidos fossem matérias de faculdade, eu pegaria DP de Olfato todos os semestres. Eu ouço bem, meu paladar e meu tato são normais, mas meu olfato está longe de conseguir uma nota azul. Talvez porque como eu enxergue muito bem, meu organismo tenha achado que o olfato é meio supérfluo e que eu não preciso dele.

Eu, claro, já argumentei com meu cérebro que preciso de todos os cinco, que por mais que eu enxergue bem eu não consigo enxergar cheiros, mas meu cérebro sempre responde que “depois eu vejo”, e não me dá resposta alguma.

Então, eu não sou daquelas pessoas que não sentem cheiro algum, mas sou o último a sentir um cheiro. Se eu abraço alguém, sinto o cheiro dessa pessoa; se eu passo ao lado de um fogão, sinto o cheiro da comida. Mas se estou no meio de um grupo de pessoas e alguém solta um “vocês não estão sentindo um cheiro estranho?”, eu automaticamente já sou colocado para fora da conversa, porque não estou sentindo nada, não faço idéia do que estão falando. Sou sempre o último a sentir os cheiros.

Isso, claro, sem contar o cheiro de mexerica.

Eu tenho verdadeiro horror ao cheiro de mexerica. Quando eu acabava de almoçar e minha mãe começava a descascar mexerica, eu tinha que fugir – não da cozinha, mas da sala. O cheiro de mexerica me dá arrepios, me deixa tonto, me embrulha o estômago. Se o assassino de Jogos Mortais me colocasse numa sala, trancado, com algumas mexericas descascadas, eu iria dar um jeito de me matar instantaneamente lá dentro.

E, claro que como eu sou eu, quando se trata de mexericas, meu olfato funciona como o de um perdigueiro. Eu moro em Pinheiros, mas se alguém começa a descascar uma mexerica na Colômbia, eu começo a passar a mal. De verdade.

Por isso, eu evito as mexericas a qualquer custo. Na cadeia alimentar, as mexericas ocupam o degrau imediatamente acima do meu. Elas são predadoras, e eu sou a presa (a escala é mais ou menos assim: “grama – boi – Rob – mexericas – vermes”). Somos inimigos mortais.

E o grande problema das mexericas é que elas atacam quando se menos espera.

Hoje, por exemplo, cheguei ao trabalho e chamei o elevador. Mais ou menos meia hora depois, ele chegou e eu entrei. Apertei o botão do quinto andar e imediatamente após as portas se fecharem, ele surgiu.

Não sei por onde ele entrava – parecia entrar por todos os lados – mas o elevador foi inundado por ondas e ondas e ondas e ondas de cheiro de mexerica. O elevador ainda não estava no primeiro andar e eu estava começando a ficar tonto. E, pior, sem ter para onde correr. Me encostei em uma das paredes do elevador e comecei a respirar pela boca, procurando por uma saída.

Nada.

Eu estava trancado ali, no mundo encantado das mexericas.

O cheiro começou a se impregnar na minha roupa, na minha pele. Meu nariz começou a escorrer. Na hora, senti um pouco de alívio, achei que meu corpo estava contraindo gripe de forma proposital, para me defender daquilo. Mas logo eu comecei a ficar tonto e percebi que não era nada disso. O cheiro da mexerica havia entrado no meu organismo e estava dissolvendo meu cérebro, que começou a escorrer pelas minhas narinas.

Reunindo o pouco que me sobrava de consciência, comecei a tentar escalar a parede do elevador, como um animal preso numa armadilha. Claro que foi em vão. Minha pele começou a queimar. Olhei para o painel do elevador: terceiro andar.

Eu ia morrer.

Não, pior: eu ia morrer e ser embalsamado em mexericas, e ia passar a eternidade em agonia profunda.

Comecei a perder os sentidos – menos a porra do olfato, claro, que não parava de funcionar. Subitamente, eu não estava mais no elevador; eu estava correndo por campos e colinas, em meio a plantações quilométricas de mexericas, todas elas descascadas.

Subitamente, uma luz à minha frente me cegou. Um enorme túnel brilhante se abria à minha frente. Não havia mexericas nele. Na verdade, algo me dizia que lá dentro existia apenas cheiro de ovos com bacon. Pessoas dentro do túnel acenavam na minha direção, me convidando a entrar ali.

Comecei a caminhar na direção dele. Eu sabia que se colocasse o pé ali dentro, tudo ficaria em paz. Eu jamais sentiria cheiro de mexericas novamente. Continuei caminhando, e, mais perto do túnel, vi que o lugar era uma espécie de churrascaria: as pessoas lá dentro estavam sentadas em longas mesas, comendo fraldinha, picanha, cupim. Olhei de relance para os copos, e vi que bebiam Coca. Nenhum copo tinha gelo e limão. Estava tocando Iron Maiden lá dentro. Powerslave.

Meus olhos se encheram de lágrimas, mas elas viraram vapor imediatamente (eu ainda estava fora do túnel, lembram-se?). E as pessoas continuavam acenando e me convidando a entrar ali.

Faltavam apenas alguns passos.

E, de repente, eu caí.

Meus pulmões estavam queimando e eu abri a boca, desesperado por oxigênio. Aos poucos, abri os olhos e vi que estava no hall do quinto andar, na porta da redação. As portas do elevador se fecharam atrás de mim, e, aos poucos, o cheiro de mexerica se dissipou.

Ainda estou meio zonzo. As pessoas e objetos não são mais iguais ao que eram antes. Tudo esta diferente. Não é fácil ter uma experiência de quase-morte e permanecer ileso.

Mas, na dúvida, a partir de agora eu vou usar apenas as escadas. Prefiro morrer sem fôlego a morrer sem ar (sim, são coisas diferentes). Mesmo porque hoje eu tive certeza de que as mexericas estão sempre me espreitando, prontas para atacar. E o que eu fiz hoje, deixar me encurralar num elevador, foi amador demais.

Nunca mais vou baixar a guarda deste jeito. Nunca mais.

15 comentários:

Natalia Máximo disse...

Frutas amigas perto, frutas inimigas mais perto ainda, lembre-se disso

Isadora disse...

Eu amo mexerica.

Varotto disse...

"alguém solta um “vocês não estão sentindo um cheiro estranho?”, eu automaticamente já sou colocado para fora da conversa, porque não estou sentindo nada, não faço idéia do que estão falando. Sou sempre o último a sentir os cheiros."

Mas, provavelmente, é o primeiro a ficar com a mão amarela (piadinha de primário mode: ON).

Também chorei com a sua descrição do que estava no fim do túnel...

Ana Savini disse...

"Se o assassino de Jogos Mortais me colocasse numa sala, trancado, com algumas mexericas descascadas, eu iria dar um jeito de me matar instantaneamente lá dentro."
"Eu estava trancado ali, no mundo encantado das mexericas."
"Subitamente, eu não estava mais no elevador; eu estava correndo por campos e colinas, em meio a plantações quilométricas de mexericas, todas elas descascadas."
Hahahhahhahahhahahha!!!
Tenho muita pena de você! O cheiro da mexerica é from hell!!!

Anônimo disse...

Rob, você é mesmo um cara exagerado. Eu sei que você passa mal com o cheiro das mexericas, mas no seu texto você dá proporções bíblicas ao seu desastre.
E eu, claro, me mato de rir com isso!

Tyler Bazz disse...

Cara....

CARA!!!

Todos os comentários que eu tinha pensado durante o post sumiram na exata hora em que eu li o comentário dessa tal Isadora.

Acho que o recado dela está bem claro......

Bel Lucyk disse...

Rob, as pessoas que voltam de situações assim sempre acabam vivendo num esquema muito auto-ajuda! Cuidado! eheheheheheheheh

George Marques disse...

Tudo o que eu tinha pensado pra comentar sumiu quando li o comentário desse tal de Tyler. Ha!

Kel Sodre disse...

Eu teria chorado com a descrição do que havia no fim do túnel se você tivesse adicionado um detalhe: "e tudo era calories free"!

Luilton disse...

Superman, kryptonita; Sansão, calvície; Eu, dívidas; Ricky Martin, mulher; Você, mexericas.

Cada um de nós temos algo que nos enfraquece. Isso é normal.

Jullia A. disse...

Mexiricas sao amigas, nao comida.

Climão Tahiti disse...

Isadora ama mexericas, logo, Rob está com os dias contados. =/

Bem observado Tyler...

rbns disse...

Ok. Sua descrição do paraíso foi maravilhosa. O detalhe dos copos sem "geli-e-limão". Powerslave.

Muito bom. Dá vontade de seguir para a luz.

Otavio Oliveira disse...

smells like teen spirit.

Hally disse...

Acho que nos encontraremos no seu paraíso... e, pelo que li, quase todos seus leitores estarão lá. Será que isso rende um post? Talvez um "Meeting meus leitores roqueiros, carnívoros, assíduos, viciados em coca cola calórica gelada, não com gelo, muito menos com limão, no paraíso"...

Tá, parei.

Mas aí é que tá, eu gosto de mexericas (que aqui no sul tem uma infinidade de nomes diferentes).

Ri do comentário do Tyler, e mais ainda do do Dragus... rere