8 de abril de 2009

Loud! I Wanna Hear it Loud!

Há 26 anos, eu entrei numa loja de discos ao lado de casa ao lado da minha mãe e pedi ao vendedor:

– Eu quero o disco do Kiss que tem aquela música “ô ô ô yeah!”, fazendo referência à introdução de I Love it Loud.

O Brasil vivia uma espécie de Kissmania, e este foi o primeiro de muitos micos que eu passei na vida. Mas, com oito anos de idade, você não se importa muito com isso. Lembro que o vendedor deu risada antes de me entregar a fita K7 de Creatures of the Night, e eu ouvia esta canção (música 2 do Lado B) o dia todo, até o Gene Simmons ficar rouco. Foi meu primeiro contato com o que se chama de “rock pesado”. Passei alguns anos ainda tentando me encontrar musicalmente, como acontece com toda criança e pré-adolescente, até que mergulhei de cabeça no hard rock e heavy metal, que se tornaram minhas paixões musicais.

Independente disso, eu sempre quis assistir a um show dos caras, porque sei que é uma das poucas bandas que eleva o conceito de show a sua máxima potência, a despeito do fato de o Kiss não estar entre as minhas cinco bandas preferidas – talvez entrasse na lista das 10 mais. Questão de gosto pessoal mesmo.

Hoje, com 33 anos nas costas, já passei por shows de Iron Maiden, Metallica, Alice Cooper, Judas Priest, Deep Purple, Aerosmith, Dio. Mas nunca havia assistido a um show do Kiss (mea culpa mode: on).

Ontem, isso mudou.

Ao lado da Sra. Gordon e de um amigo, montamos nosso pequeno Kiss Army e fomos para o show. Na verdade, enquanto os fãs do Kiss são realmente o “exército do Kiss”, nós três éramos uma espécie de Incrível Exército de Brancaleone: eu, totalmente arrebentado depois de dois dias nada leves no trabalho; Sra. Gordon, exausta e com o pé quebrado. Já meu amigo... Bem, no momento em que cheguei a Arena Anhembi com o meu ingresso e o dele nas mãos, ele ainda estava no trabalho, do outro lado da cidade. Assim, montei um esquema de guerra com uma menina da organização para entregar o ingresso dele quando (ou se) ele chegasse e entrei para encontrar Sra. Gordon, que já estava lá dentro.

Felizmente, deu tudo certo. Ele chegou cerca de uma hora depois. Se bem que cabem umas aspas no “tudo certo”. Eu odeio ir assistir a um show de pista. Com a minha altura, show de pista e metrô lotado é a mesma coisa, eu só vejo ombros e costas para qualquer lado que eu olhe. E jurei que nunca mais iria num show de pista desde o show do Metallica em 1994 (turnê do Black Album (chupem leitores com menos de 30 anos)), quando eu quase morri na saída (não é exagero). E não me venham com aquele papo de que “o agito está na pista”. Parto do princípio que, num show, o agito está no palco, e eu quero ir para ver o palco.

Felizmente, Sra. Gordon providenciou um “lugar de idosos” na pista: uma espécie de buraco entre o posto médico e a área de imprensa, de onde podíamos assistir a segunda melhor coisa de um show de rock: a platéia. Curiosamente, um show do Kiss, que, por definição, deveria ter o maior número de pessoas estranhas da face da Terra por metro quadrado estava razoavelmente normal, com direito a famílias e tudo o mais. O que mais chamava a atenção eram as pessoas pintadas como os músicos, mas nada de muito bizarro.

E ficamos observando a platéia durante boa parte do show de abertura, do Dr. Sin, banda que eu já havia ouvido falar muito, mas nunca tinha me dado ao trabalho de escutar. Sinceramente? Bem meia boca. Musiquinhas pasteurizadas, vocalista dizendo que é uma honra abrir o show do Kiss, e uma canção que diz que o brasileiro gosta de “futebol, cerveja e rock’n’roll” com direito a corinho de “êta, êta, êta, brasileiro quer...”. Ou seja, composições nível ônibus escolar.

Felizmente, não durou muito. Logo, começa a tocar Won’t Get Fooled Again, do The Who, no sistema de som, e uma enorme bandeira Kiss cai sobre o palco, com as luzes se apagando. O local começa a vibrar de excitação. Expectativa total. De repente, o berro:

Aaaaaall right, São Paulo!

Antes que eu pudesse ouvir o resto do berro clássico, tive que sair correndo na direção de um dos vendedores de hot dog que parou na minha frente (com aquele isopor imundo na cabeça) para ver a abertura do show e pedir delicadamente para ele “tirar esta bosta da minha frente.” Voltei ao meu lugar e ainda consegui aproveitar o restinho de “...band in the world: Kiss!

A platéia veio abaixo, logo nos primeiros acordes de Deuce, emendada por Strutter – dois clássicos do primeiro disco da banda. E, com poucos minutos de show, uma coisa já fica clara: por mais que Thomy Thayer e Eric Singer sejam excelentes músicos, o show é todo de Paul Stanley (que está cada dia mais parecido com um misto de Lúcia Veríssimo e Simone) e de Gene Simmons – sendo que este, sabendo do status de ícone, na metade do show já desfilou sua língua pelo palco e cuspiu fogo, duas de suas marcas registradas.

Nesta primeira metade do show, desfile de músicas antigas (afinal, a turnê celebra os 35 anos da banda), com o grupo claramente guardando os grandes sucessos para a parte final. Mas, mesmo assim, a garra dos músicos ao interpretar outros clássicos como C’mon and Love Me, Hotter than Hell, 100.000 Years empolga o público – até mesmo quem conhece a banda somente por um dos inúmeros best ofs que não contém essas canções.




Mas claro que, enquanto a platéia (e eu) estava adorando o show, algo tinha que dar errado comigo. Durante o solo de Eric Singer, um sujeito que estava às portas do coma alcoólico teve uma crise de carência durante o show e sentiu uma necessidade fisiológica de fazer amigos. Olhou ao redor e achou que aquele baixinho careca no canto parecia ser simpático. Nosso primeiro contato se deu quando ele começou a dançar rodando a camisa na frente da minha cara. Tentei afastá-lo, e ele achou que isso era minha maneira de demonstrar que eu estava disposto a fazer amigos.

Durante uns quinze minutos, ele dançava e comentava o show comigo, mantendo o rosto dele a cerca de 20 centímetros do meu rosto enquanto falava. Se alguém viu isso de longe, deve ter achado que éramos namorados. Eu tentando ver o show e, a cada 30 segundos, ele vinha com informações que achava importante compartilhar:

– O Gene Simmons nasceu lá nas arábias!

– Essa banda é foda!

– Na época do Peter Criss, não rolava solo de bateria!

– Essa banda é foda!

Quem me ajudou a despachar o sujeito foi o Paul Stanley, que estava puxando gritos da galera. Tudo o que eu precisava naquele momento é que outra pessoa falasse comigo, para que eu pudesse mostrar a ele que estava mais interessado no show (ou em qualquer outra coisa) que nas informações que ele queria compartilhar. Acabou sendo o guitarrista do Kiss.

Vou tentar reproduzir aqui o que aconteceu, em tempo real:


Paul Stanley (do palco): Hey, hey, hey, Yeah!

Bêbado (simultaneamente ao Paul Stanley, a oito centímetros do meu corpo): Qual sua música preferida?

Rob Gordon (atingindo 140 decibéis, com a boca colada no ouvido do bêbado): Hey, hey, hey, Yeah!


Meu gritou causou algum dano no tímpano direito dele e serviu para me dar uns minutos de sossego (e fazer a Sra. Gordon cair no chão de tanto rir), e ele foi tentar falar no celular com alguém. Mas logo ele decidiu reatar nossa amizade e veio comentar que morava no Tucuruvi e que todo mundo no bairro sabia que ele era fã do Kiss.

Meu saco já estava cheio como um balão de gás, de tão cheio, mas Deus (ou o God of Thunder, para os iniciados), ouviu minhas preces e o bêbado decidiu que queria mais cerveja, me perguntando onde ele podia comprar. Disse a ele que a barraca ao lado de onde estávamos não tinha mais cerveja, que o show é desorganizado, é tudo uma bosta e que ele teria que ir para o outro lado da pista. Como eu era seu melhor amigo dele, ele acreditou e sumiu. Amém.

O sumiço dele foi um presságio para o início da segunda metade do show, que alternava discursos do Paul Stanley dizendo que ama o Brasil e mais clássicos, como Cold Gyn e Black Diamond, se encerrando com o hino Rock and Roll All Nite, que é o pretexto para o palco se tornar uma espécie de Cassino do Chacrinha, com chuva de papel picado e fogos. Este é o segredo do Kiss: qualquer outra banda tornaria isso cafona; com eles, funciona.




Após um intervalo rápido, a banda volta para o bis, e, a partir daí, é só musicão, abrindo com Shout it Out Loud e Lick it Up. Eis que surge o momento mais esperado da noite, para mim: o solo de Gene Simmons, com direito ao baixista babando sangue e voando para cima do palco, de onde tocou I Love it Loud (aka a música que mudou minha vida, como dito acima) cuja letra foi cantada por 29.998 pessoas. Apenas duas pessoas não c antaram: uma, de pouco mais de metro e meio, estava ocupada demais gritando “caralho!”; outra, totalmente embrigada, deveria estar tentando atravessar um mar de gente para conseguir comprar uma cerveja.

Com o show se encaminhando para o final, é hora de Paul Stanley voar, agarrado numa tirolesa, para o meio da platéia, de onde cantou Love Gun. Volta para o palco principal e hora de fechar a noite com outro hino: Detroit Rock City.

Fogos de artifício, luzes acesas, hora de ir embora. Não entra nos cinco melhores shows da minha vida, mas apenas porque a concorrência é grande. Foi um show sensacional e algo que eu queria ter visto há muito tempo. Assim, de todas as bandas que eu jurei que ver antes de morrer, me sobra apenas uma pendência: AC/DC. E espero que quando isso acontecer, o bêbado do Tucuruvi ainda esteja tentando encontrar a barraca de cerveja da Arena Anhembi.

E, para me despedir (prometo que volto com a saga da Besta-fera no próximo post), deixo vocês com o meu Top 5 Músicas do Kiss:

1. I Love it Loud
2. Gof of Thunder
3. Deuce
4. Detroit Rock City
5. Creatures of the Night

20 comentários:

Maria Fernanda disse...

Pra mim a melhor música foi She.
A música deles que mais gosto, sabe? Putz, se bem que tem blogueiro por aí que não presta atenção em amigas que entram a semana inteira com o nick - Kiss, I Love it Loud. Hehehhe.
Beijo

Anônimo disse...

ALO MEU CARO !!!
QUE SHOW ... QUE NOITE ...
VC DISSE QUE A SRA GORDON MORA NO TUCURUVI ??? EU TB ... E SEMPRE FUI FÃ DO KISS . TENHO 36 ANOS ... SERA QUE EU A CONHEÇO ???
ISSO NÃO IMPORTA ... O IMPORTANTE FOI TER O IMENSO PRAZER DE VER O MAIOR ESPETACULO DA TERRA !!!

ABRAÇOS ...

Kel Sodré disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Kel Sodre disse...

"(prometo que volto com a saga da Besta-fera no próximo post)"

Sendo hoje, por mim, tudo bem...


PS: o comentário anterior era meu. Excluí pra poder comentar com minha conta de google certa. Malditas duas contas no google!

Anônimo disse...

Maurício

Na verdade, quem mora no Tucuruvi é o bêbado-mala.

Showzaço, hein?

Abração

Kel Sodre disse...

huahuahuahuahuahuahua

Mauricio, pelo que entendi do texto, o bêbado-amigo-do-Rob mora no Tucuruvi. A sra. Gordon só moreu de rir!

Varotto disse...

Camarada Gordon, eu deixei para esta semana a decisão de ir, ou não, ao show e acabou não rolando. Na verdade, não vai rolar, já que o show ainda não começou.

"I love it loud" também me traz boas lembranças. Eu tinha uns 11 anos na época daqueles shows no Brasil. Só se falava nas lendas (línguas de vaca, pintinhos esmagados, etc.). E aquele video-clip com adolescentes "zumbificados". Também queria poder dizer que fui assistir a um show deles mas, infelizmente, ainda não vai ser dessa vez.

Quem sabe na tour de comemoração dos 80 anos do Gene Simmons?

Se tivesse de escolher uma música da nova geração para constar na lista, escolheria "Unholy". Pau puro!

Ana Savini disse...

Rob, quase chorei lendo sua postagem. Nesse ano de vacas magras estou perdendo vários shows históricos.
Vc comprou o Creatures of the Night c/ 8 anos. Eu pedi p/ o Papai Noel!! kkkkkkkkkk!!
Kiss não é minha banda preferida, mas os caras são um "patrimônio" do Rock 'N' Roll!

Persona disse...

MORRI... de rir com o bebum... fiquei imaginando aquele bafo de cerveja na sua casa e aquelas salivas que, inevitavelmente, acabam caindo na nossa cara... bêbado já fala cuspindo, imagino num show desses que a gente tem que gritar.
Não sei porque as pessoas tem que arrumar alguém para conversar o tempo toda... minha paciência é zero!
Olha, eu acho que ainda não fui em nenhum show inesquecível, gostei muito do da Madonna, mas os shows que realmente queria assistir não vai dar porque os caras já estão comendo grama pela raíz...

Besos

Hally disse...

Puxa vida, não consigo descrever a inveja que sinto de ti agora, depois de ler esta postagem... (menos do bêbado, é claro :P).

Maasssssss, AC/DC virá. E este, eu não perco. Até porque, se não fosse AC, eu seria mais uma na multidão, ouvindo "musiquinha pra mulher".

E, quando este fenômeno raro acontecer de novo em terras tupiniquins, morro feliz!

Nash disse...

"(...)desde o show do Metallica em 1994 (turnê do Black Album)"

Que inveja do C$%@$#%...

Um defensor do pensamento livre disse...

Ótima sua resenha! Vc teve o bêbado, eu aguentei o "cazuza" - um drogadinho que está em pauta nas principais comunidades do orkut...rs Postei tambem um texto sobre o show, dá uma olhada: http://lexotan36mg.blogspot.com/2009/04/kiss-alive-35-tour.html

Forte abço.
P.S: quando vc escreve "chupem leitores com menos de 30 anos" vc realmente fere meus sentimentos...perdi esse...rs

Shout it Out (a)Loud disse...

Cara... não me lembro que idade eu tinha, mas sei que vi o Gene Simmons na tv, pintado e sentí medo... juro! Não comprei nem a fita K7 e nem o lp, mas aquele momento mudou minha vida tbém...

Ps: caraca... só eu que percebí ou o tal Mauricio do segundo comentário É o bebado do tucuruví?

Flavita disse...

Ai, ai, ai, outro ataque de riso no meio do salão. Ainda vou ser internada.

Thiago Apenas disse...

"E jurei que nunca mais iria num show de pista desde o show do Metallica em 1994"

Você está intimado a contar esse episódio!

PS - Inveja do caralho mode :on

Kel Sodre disse...

Cadê o resto da saga da Besta-fera???


"Ps: caraca... só eu que percebí ou o tal Mauricio do segundo comentário É o bebado do tucuruví?"

Também pensei nessa possibilidade, mas não quis ser rude...

rbns disse...

Putz! O show do Metallica em 1994.

Lembra?

Só uma saída aberta, milhares de metaleiros e o meu anão predileto sendo pisoteado.

Além de evitar que eles me esmagassem eu ainda precisava impedir que te pisoteassem. Foi divertido.

Cara como nós distribuímos cotoveladas naquela noite...

Fábio Buchecha disse...

Só sei que semana que vem eu vou pro show do Motorhead aqui em Recife!

Rá!

Chupa Rob Gordon!

Vinicius Maffei disse...

"E jurei que nunca mais iria num show de pista desde o show do Metallica em 1994 (turnê do Black Album (chupem leitores com menos de 30 anos)"

Maldito! haha.
Infelizmente esse do Kiss eu perdi, mas pro Heaven and Hell em maio eu to com o ingresso na mão!

Jéssica disse...

MUUUUUUUUUITO foda o show hein?!
mesmo com meus 14 anos e 1.60 de altura, e nao enxergando mta coisa, foi o meçlhor dia da minha vida!
pena que nao tocou god of thunder, psyco circus e forever, mais foi perfeito!

SHOUT IT, SHOUT IT, SHOUT IT OUT LOUD! EVERYBODY SHOUT IT OUT LOUD!