2 de agosto de 2006

Chico Buarque e os Dias-Suíça

Quem me conhece, sabe que sou consumista por vocação. Sempre fui, desde criança. Eu não podia entrar numa banca de jornais com a minha mãe que eu precisava sair com algo embaixo do braço, desde um Cebolinha ou um Almanaque Disney – naquele tempo, Marvel e DC, para mim, eram apenas revistas com capas muito legais, mas que não me interassavam além disso – ou 10 pacotinhos de figurinha de qualquer coisa. Se eu não achasse na banca, para não perder a viagem, eu literalmente descobria algo para comprar, como aquelas coleções vendidas em facículos semanais caríssimas e completamente inúteis, tipo "Cavalos Marinhos" ou "Guerreiros da Idade Média". Ou seja, se existisse uma faculdade de "consumismo desenfreado", eu seria ou tema de TCC ou nome de Centro Acadêmico.

Enfim, o tempo foi passando e, para felicidade da minha mãe, comecei a investir o meu próprio dinheiro nesse tipo de bobagem. E, se, por um lado eu aprendi a controlar (um pouco) a minha grana, já que palavras como aluguel e condomínio fazem parte da minha rotina, aprendi também a focar meu consumismo somente naquilo que gosto.

O problema, descobri, é que gosto de tudo.

E é aí que entram as minhas fases. Eu consigo focar em algo por apenas alguns dias, e depois foco em outra coisa. Passam-se mais uns dias, e descubro ou lembro de uma terceira coisa. E por aí vai, sucessivamente. E dá-lhe "3 vezes no cartão".

Quer um exemplo? Mês passado, eu acordei um dia e, enquanto escovava os dentes antes de ir para o trabalho, surgiu, na minha mente, em neon verde, o nome ALICE COOPER. Pronto, o estrago estava feito. Já saí de casa cantando e dançando Billion Dollar Babies, tendo como platéia meu cachorro que, apesar de não me entender completamente, já se acostumou com esse tipo de coisa. Até chegar ao trabalho, cantei trechos de School's Out, Poison, Only Women Bleed e I'm Eighteen. Saí para almoçar e dei de cara com a Fnac. Ela brilhava. Eu podia sentir o cheiro de Alice Cooper na rua. E, como sempre, menti para mim mesmo, dizendo que "vou até ali só para fazer a digestão do almoço". Obviamente saí de lá com uma sacola Alice-Cooperiana. E, fiquei, por umas 2 semanas, só com isso na minha vida. Escutava o dia inteiro, cantava o dia inteiro, ficava buscando lendo sites e matérias sobre ele.

2 semanas depois, estava vendo TV a tarde, em casa, e senti um arrepio no corpo: "Faz tempo que não leio nada sobre II Guerra Mundial". Pronto. Alice Cooper continua presente na minha vida, mas numa intensidade bem menor. Agora, a moda é II Guerra Mundial. Saio, compro 2 ou 3 livros, e me esqueçam: vou passar os próximos dias em alguma trincheira na Normandia, num campo de concentração nazista ou em alguma ilhota do Pacífico. E, antes da guerra acabar, no meio de algum tiroteio, eu vou ter um estalo: Quadrinhos! Jogo pra PC! ou West Wing!

E assim vou vivendo, à base de parcelamento sem juros no cartão de crédito.

Por isso que hoje eu achei que poderia entrar e sair impune da Fnac. Porque não estou em nenhuma fase dessas. Hoje, literalmente, eu estou no que eu chamo de 'dias-Suíça". Neutralidade total. Não quero nada e não tenho nada em mente para comprar. Não fico olhando para a minha coleção de CDs do Judas Priest para ver quais CDs faltam, ou colocando minha coleção de quadrinhos separada por título para ver o que preciso comprar. Chego a me sentir, por uns momentos, como uma pessoa normal.

Bom, é pior. Entrar sem foco numa loja dessas não significa que você vai partir impune. Pelo contrário, você é atacado por todos os lados. Ou seja, entrar numa loja atrás de Led Zeppelin, por exemplo, funciona como um escudo . "Não, não me importa que saiu um Homem-Aranha novo. Estou aqui atrás de Led Zeppelin". E hoje, eu estava ali. Sozinho, com meu cartão, entregue ao Deus dará.

E, para piorar tudo, eu não me ajudo. Você acha que vou olhar preços de televisão e home theater, que é algo que definitivamente não iria comprar assim, com displicência, depois de um almoço? Comprar uma TV de 29'' tela plana é como jogar contra o Boca Juniors, pela Libertadores, lá na Argentina: tem que ter planejamento e respeito, não pode ser tratado com descaso. Não rola de acabar de almoçar e falar: "vou comprar uma TV". Ou seja, é seguro ir lá em olhar TVs e mais TVs. Tela plana. Olha essa de plasma. Uau, olha aquela!

Mas, não, eu desço na parte de CDs e DVDs e começo a procurar encrenca. E, o que é pior, vou dizendo para mim mesmo: "vou só olhar". Em 3 minutos, eu pareço aqueles pioneiros de filmes antigos, andando no deserto com uma forquilha na mão, atrás de água. Uma força invisível vai me guiando pelas prateleiras. E hoje foi assim. Passei na parte de DVDs e ouvi uma voz dentro de mim "CDs Nacionais. Fui para a parte de Hard Rock / Heavy Metal e, dentro de mim, aquele ímpeto: "CDs Nacionais". Enlouquecido, tentei subir para o outro andar, onde ficam as revistas e ouvi, desta vez, um grito dentro de mim "CDS NACIONAIS, Ô BABACA!"

Temendo pelo pior, me virei para a maldita parte de música brasileira e lá estava, em destaque: "Chico Buarque – Os Primeiros Anos". Merda. Parece ser um pack. Merda. Os 3 primeiros CDs? Merda. Resmaterizados? Merda. Eu deveria ter entrado aqui atrás de Iron Maiden, eu tenho tudo sobre Iron Maiden, não iria correr risco nenhum. Mas, nãããão... Eu tinha que entrar aqui, exposto e indefeso.

Agora, são os 3 primeiros discos do Chico Buarque. Você acha que eu NÃO comprei?

E, agora estou aqui, ouvindo os discos. E enquanto Pedro Pedreiro está esperando o trem, o babaca aqui está esperando pela próxima fase. Ansiosamente. Odeio os malditos dias-Suíça.

5 Fases de Consumo mais Recorrentes na Minha Vida

1. Iron Maiden - uma das poucas bandas do mundo que fico puto por ter todos os discos. Por mim, eles lançavam um CD por dia. Aliás, esquece, é melhor continuar desse jeito, assim gasto menos.
2. Séries de TV - Você nunca acordou e, ao abrir os olhos, percebeu que jamais poderia ser feliz na sua vida sem a 4ª temporada de Família Soprano em casa?
3. Romances Históricos - Vira e mexe estou no Japão feudal, em alguma batalha na Idade Média ou no meio do Império Asteca.
4. Chico Buarque - Não é raro eu comprar uns 3 CDs dele de uma só vez - nem que seja só para ficar lendo as letras e tentando entender como ele consegue fazer aquilo.
5. Quadrinhos - Esse é o mais simples de todos. Acordo, vou na Comix e 2 horas depois, declaro falência.

7 comentários:

Anônimo disse...

caríssimo rob gordon, veja esse link....

http://www.malvados.com.br/index829.html

é a história de sua vida?

grande abraço.

Anônimo disse...

Conheço bem do assunto! Agora, Chico Buarque com Iron Maiden num dá samba não hehe

Anônimo disse...

Rob, esse texto sobre chico/dias suíça tá bacana, muito legal... Às vezes o Ale e eu comentamos sobre esse consumismo desenfreado que temos também, ele por quadrinhos e eu por qualquer coisa que tenha que pagar. Ficou muito bom. Me identifiquei demais com uma parte da lista que você diz: 2. Séries de TV - Você nunca acordou e, ao abrir os olhos, percebeu que jamais poderia ser feliz na sua vida sem a 4ª temporada de Família Soprano em casa?

Anônimo disse...

Acabei de receber: ViagraXanax@hotmail.com. É seu !?

Well well... o pior de tudo nao é vc ser consumista assim... o pior de tudo é você transformar as outras pessoas em seus pupilos !!!! Maldito !!! Meu dinheiro (nenhum) tá indo embora... seu cinéfilo de merda!

Anônimo disse...

rob, meu velho, tenho que lhe dizer o seguinte... hoje luciana e eu conseguimos um dia-suiça totalmente excelente.... só não passamos na comix, com a graça de jesus maria josé, porque senão não seria um dia suiça. mas passamos na fnac de pinheiros, aí mesmo, perto da residência oficial da chamionship vinyl, e passamos incólumes. nada de gasto, just windowshopping.

mas graças ao seu post, estou em um dia suiça hoje. xongas.

Anônimo disse...

ôrra. Tu é rico eim.

Eu sou consumista, mas como ainda tenho 13 anos, eu só peço, peço, peço. e de 50 coisas que eu peço, 1 ou 2 eu consigo.

Fabi disse...

Tive fases assim, mas melhorei muito. Inclusive fui lendo o post e pensando a respeito: melhorei muito MESMO.

Mas ficam as sequelas, tipo ter o melhor dicinoário português-espanhol do mercado. Não, nunca fiz uma aula de espanhol, mas no meio da faculdade, cismei que ia fazer monografia sobre História da América, desci na livraria da faculdade e voilà, tá ali o dicionário intocado até hoje. E 'cabou que fiz Licenciatura, nem passei perto da monografia.

Enfim, te entendo. Em parte me controlei, em parte tenho gastos de adulta agora, então quase não faço mais isso.