13 de julho de 2009

Bruxa do Mar Vai às Compras - Parte Final

(leia a parte II aqui)

Respirando pela boca, comecei a passar minhas compras, com a Bruxa do Mar logo atrás de mim. Coloquei minhas humildes duas mercadorias na esteira, respondi ao código secreto (“não, não sou Cliente Mais”) e me preparei para escapar de tudo aquilo. A Bruxa do Mar correu para trás do carrinho – segurando o iogurte com uma das mãos – e o empurrou com tudo na minha direção, talvez com medo de que alguém roubasse sua vez na fila.

Com isso, a menina do caixa quase enfartou. Eu fingi que aquilo era a coisa mais normal do mundo e não dei atenção. Apenas olhei para a saída do Pão de Açúcar, sonhando com o ar deliciosamente esfumaçado e poluído, mas totalmente papaya free, da Teodoro Sampaio. Eis que ouço:

– O requeijão cremoso custa R$ 4,25?

Quê? Requeijão? Que requeijão? Que R$ 4,25? Achei que eu estava começando a delirar por causa do mamão. Fechei os olhos e tentei colocar minha mente em ordem. Meus neurônios, imediatamente, dispararam avisos para o resto do corpo, informando que todos os arquivos contendo a palavra “requeijão” continham vírus e deveriam ser apagados sumariamente.

– O requeijão cremoso nunca custou isso.

Abro os olhos e me viro para a bruxa. Ela estava quieta e entretida com o maldito iogurte.

Olho para o outro lado, e vejo o casal de velhinhos. Ele, com uma sacola nas mãos; ela, segurando a nota fiscal nas mãos, alegando com a mulher do caixa que o preço do requeijão era injusto e que este produto nunca havia custado isso.

A menina do caixa olhou para mim. Eu olhei para ela. A menina do caixa olhou para os velhinhos. Eles olharam para ela. Eu olhei para os velhinhos. Os velhinhos olharam para mim. Eu olhei para a Bruxa. Ela não olhou para ninguém, pois estava chupando o iogurte dos dedos, refugiada em um mundo próprio com cheiro de mamão e, aparentemente, alheia a tudo aquilo.

– Esse foi o preço que passou, disse a caixa aos dois velhinhos.

– Não interessa! Nós não vamos mais levar!, disse a metade feminina do casal.

– Slurp, disse a Bruxa.

– Bom, então eu tenho que estornar a compra, disse a caixa.

– Slurp, disse a Bruxa, antes de enfatizar ainda mais sua opinião soltando um discreto arroto.

Entrei em pânico. Eu já vi alguém estornar uma compra no Pão de Açúcar. Demora dias. Eles precisam digitar códigos, ligar para o fabricante do produto, pegar autorização com o governo dos Estados Unidos, inserir mais códigos – e às vezes não dá certo e precisam começar tudo de novo. É mais ou menos como pedir um sanduíche especial no Mc Donald’s.

Olhei para o carrinho da bruxa e, assustado com seu estoque de iogurte de mamão – ainda tinha pelo menos meia dúzia, e ela parecia continuar com fome –, decidi que precisava fazer algo. Chamei os velhinhos:

– Com licença?

– Pois não?

– Eu estou no meio de uma emergência, será que vocês não podem me deixar passar essas mercadorias?

Mas, no momento em que acabei de falar, percebi que tinha feito uma cagada. Afinal, que tipo de pessoa poderia estar envolvido numa emergência e, ainda assim, ir ao mercado comprar um pacote de espetinhos congelados e um chocolate?

Eles olharam para as minhas compras – eu tentei cobrir os espetinhos com as mãos – e, para desviar atenção deles, coloquei minha outra mão na barriga. Fazendo a minha melhor cara de problemas intestinais crônicos, implorei:

– Por favor?

Eles se olharam em silêncio. O cheiro do mamão começou a ficar cada vez mais forte. A Bruxa começou a revirar suas compras, provavelmente procurando algo para comer. Vi um pacote de lingüiças no meio do carrinho e senti um arrepio.

Os velhinhos, aparentemente, continuavam decidindo meu destino telepaticamente, e ainda não haviam chegado a uma conclusão. Resolvi apelar. Soltei um gemido baixo e, apertando a barriga com uma das mãos (a outra ainda estava sobre minhas compras, estrategicamente tapando as palavras “espetos para churrasco”), como se tentando apartar uma briga entre os intestinos delgado e grosso, implorei:

– Eu realmente estou com pressa. Não estou me sentindo muito bem.

Foi o suficiente. O casal de idade decidiu que alguns reais a menos na conta não valeriam a pena, especialmente perto do vexame que, aos olhos deles, estava prestes a acontecer ali.

– Tudo bem. Mas é só isso, certo?

– Sim.

– Só essas duas coisas? Você não vai comprar mais nada?

– Não, é só o chocol... É... Os espetin... É, é só isso.

– Tá. Pode passar.

Mais que depressa, entreguei minhas coisas para a mulher do caixa, peguei o cartão do banco e passei, tentando me concentrar na minha expressão, que certamente seria indicada ao Oscar de Melhor Cara de Pessoa Prestes a se Borrar – o que não era difícil, dado o cheiro do mamão. Digitei a senha, peguei minhas compras e saí rápido do mercado, para dar mais veracidade ainda à minha suposta crise interna.

Chegando à porta do mercado, não agüentei e olhei para trás. Os velhinhos gesticulavam agitados, provavelmente discorrendo sobre as mazelas do mundo moderno e o preço do requeijão cremoso. A mulher do caixa tentava se defender de alguma forma.

A Bruxa do Mar, por sua vez, estava tomando mais um iogurte – provavelmente de mamão, mas não tenho como saber ao certo – com os dedos. Mas o que mais me assustou foi o fato de que ela estava, com a cabeça baixa e olhar de alguém possuído por algum demônio, olhando fixamente para mim.

Senti um arrepio de medo e, quase me borrando – desta vez, de verdade – dobrei a esquina e fugi do contato visual dela, me benzendo. Passei o resto da semana jantando apenas comida de delivery, com medo de entrar no Pão de Açúcar novamente.

Enquanto o mundo tem a Dani Bananinha, a Mulher Melão, a Mulher Maçã e a Mulher Moranguinho, é logo a Bruxa-Mamão quem encana comigo.

Ô fase.

20 comentários:

O Frango... ® disse...

voltar para que? Provavelmente os velhinhos estão lá até hoje, porque descobriram que o o preço do biscoito cream cracker tava um absurdo também. Afinal, onde eles iam passar o requeijão, cujo preço já tinha sido arrumado?

E provavelmente os iogurtes da bruxa do mar ainda não iam ter acabado... e seriam de mamão, com certeza.

Fox disse...

AHAHAHAHHAHAHAHAHAhaHA

so voce para pensar numa saida dessas, so voce! AHAHAHAHAAHHA

e eu tambem nao voltaria tao cedo aquele lugar.

abracos =]

MPauloS disse...

Cara, parece que você é contantemente alvo de coisas malucas uahuahahau, infelizmente para você e felizmente para os leitores do champ-vinyl.

Sil disse...

Amei a saga da Bruxa-Mamão ^_^
Só você mesmo para conseguir transformar uma loucura dessas em comédia^_^
Beijos
Sil

EU disse...

Dá até vergonha da minha válvula de escape! Conheci hj teu espaço por curiosidade e me dei conta de que já estou a 2h e 1/2 aqui lendo, lendo, rindo, rindo...o máximo!

Leandro disse...

"totalmente papaya free"

AHAHAHAHAHHAHAHAHAHAHAHA...

Marina disse...

Ah, bom. Pensei que você ia deixar os velhinhos encrencarem com o preço do requeijão sem dizer nada. Mas já vi que menosprezei você e sua representação de pessoa com diarréia. Rs. Boa saída.

Anônimo disse...

Que coisa mais nojenta ficar lambendo os dedos sujos de iogurte de mamão.
Só pioraria a situação se fosse de banana. Urgh.

Coitado do casal de velhotes.
Assim como eles ficaram pasmos com o preço do requeijão, eu tbm fiquei... Na verdade, meu problema foi com a maionese. Fiquei mais de um ano sem entrar num supermercado (tocs e fobias) e os preços agora, parecem monstros querendo me amedrontar....
lol

Dari

rbns disse...

Tá. Desta vez eu me matei de rir. Achei que vc. ia se oferecer para pagar a diferença do que eles achassem justo no iogurte. Mas sua saído foi melhor :-)

Ana Savini disse...

Sem sombra de dúvidas, a saga Bruxa do Mar Vai às Compras foi a mais engraçada q já li aqui.
XD

Isabella disse...

MEU DEUS... MORRI DE RIR COM OS TRÊS TEXTOS. SÉRIO, MTO SÉRIO, ESTOU PASSANDO MAL...

Desculpe a insensibilidade com seu problema, bruxa, mamão, iogurte com as mãos (argh) etc... Mas foram os melhores posts que já li... Ai ai...

Parabéns...

Vá ao Extra Brigadeiro. Lá vc vai encontrar a Bruxa do Mar e mais sua família inteira. Um show de bizarrices! E mais uns post hilários, garanto!

Beijo!

Climão Tahiti disse...

Pelo menos essa Bruxa-Mamão ainda não tentou sua carreira musical...

Thiago Apenas disse...

Quer ver o inferno?

Vá em uma feira livre aos domingos de manhã.Muitos já foram, porém poucos voltaram para contar a história...

Hally disse...

É incrível como o Pão de Açucar te dá posts maravilhosos...
Por favor, mesmo com medo da bruxa-mamão, não deixe de ir lá e voltar com estas pérolas da comédia exagerada!

O Champ deve ter ficado feliz com esta saga!!

Mariñaaa disse...

Fiquei sabendo do seu blog hoje, pela @pararaiodedoido. Adorei seus textos, vou acompanhá-los. ;-)

(@pdomingues)

Anônimo disse...

Cada um tem o que merece, meu caro. hahahhahahhahhah
-
Adoro suas analogias das situações humanas e situações típicas do ambiente computadorizado. Creio que já esteja virando chavão na linguagem de outros blogueiros.
-
Enfim, mais um texto que consegue prender o leitor =D

Jullia A. disse...

Eu, se fosse voce, iria ao carrefour.
:D
não que as atrocidades sejam muito menores.

Thiago Dalleck disse...

Eu queria ser onipresente na vida do Rob Gordon, deve ser muito engraçado! hahaha

Perci Carvalho disse...

(o ultimo é pequeno... nao tive muito a dizer)

eu estavanametade do post, meu patrao chegou - em complô ctgo né?! - e tive que esperar pra poder terminar, to puuuta... mas valeu o post... rsrs

aliás, comentando o post:

KKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKK


um desenho animado lambuzado de iogurte de verdade, um casal de velhinhos pra empatar mais ainda e vc - no carrefour do Floresta...fingindo dor de barriga?!?! eu pagava pra ver a cena... juro!!


bjo e fui

Carol disse...

Cara... Quase me borrei de rir.