7 de junho de 2009

Mundo Cão

Nada me incomoda mais que passear com a Besta-Fera. E não por causa do comportamento dele – que insiste em parar e cheirar todos os cantos de todas as calçadas (algo que qualquer cachorro faz) e depois sai correndo me arrastando pela rua (algo que só o meu cachorro faz). Mas sim por causa das outras pessoas, especialmente aquelas que estão passeando com seus respectivos cães.

Não vou nem abordar aqui as pessoas que andam com seu cachorro solto, sem coleira. Você está passeando com o seu e vem aquele cachorro com o dobro do tamanho do seu rosnando e latindo – e invariavelmente seguido pelo dono, que sempre fala algo como “ele só quer brincar”. Sei. Brincar. Aí, se eu dou um chute na cara do cachorro dele para proteger o meu, sou eu que estou errado.

Mas, enfim, existe uma espécie de maçonaria formada pelas pessoas que passeiam com cachorros. Qualquer pessoa que está passeando com um cão acredita que isso é motivo suficiente para poder puxar papo com as outras pessoas que estão na mesma situação. Funciona mais ou menos como “eu e você temos muito em comum (leia-se: um cachorro) então nós obrigatoriamente devemos ser amigos”. E não adianta eu olhar com aquela cara de “não quero conversar”, porque não adianta.

E isso é uma verdadeira praga entre os donos de cachorros.

Outro dia, indo para o trabalho, vi duas mulheres conversando na porta do meu prédio. Cada uma segurava seu cachorro (um era lhasa-apso, o outro não lembro) e conversavam animadamente justamente sobre... Cães. O detalhe é que os dois cachorros não pareciam muito felizes com o encontro, e estavam latindo um para o outro, cada um deles visivelmente querendo pegar o outro na porrada. E as mulheres ali, rindo, e achando lindo o fato de “eles terem virado amiguinhos”.

Mas o pior mesmo é o nível de deficiência mental dessas pessoas. Veja bem: não é porque você trata seu cachorro como uma criança que as outras pessoas fazem isso.

Ontem, eu estava passeando com a Besta-Fera e, na metade do passeio, vejo, do outro lado da rua, uma mulher de uns 60 anos passeando com um poodle. Assim que ela me viu, atravessou a rua para vir falar comigo. Eu respirei fundo e considerei a hipótese de dizer algo como “não deixe o seu cachorro chegar perto do meu, porque o meu está infectado com lepra”, mas não tive tempo. Assim que ela chegou perto de mim, já soltou um:

– Oi!

Assim mesmo, com uma exclamação totalmente audível.

– Oi.

Fiz questão de deixar o meu ponto final (e minha falta de empolgação) bem claro. O poodle começou a cheirar a Besta-Fera (que, refletindo o comportamento do dono, não sabia direito o que fazer, mas mostrando claramente que não estava confortável). Aí, ela começou com aquele papo-clichê-repleto-de-termos-boçalizados:

– É menino ou menina?

Nem um, nem outro. É um cachorro. Eu ainda vou ter coragem de falar isso um dia. Mas não foi desta vez.

– É macho.

– Ah, o meu também é! É macho e adora passear!

Foda-se.

– Ah.

– E ele adora encontrar outros menininhos para brincar!

O que é isso? O poodle já não parecia ser muito homem, e a mulher ainda iria ficar cafetinando ela na rua? É um cachorro de programa? Um michê canino?

– Que ótimo. Deixe eu ir. Vai chover.

– Mas ele...

– Tchau!, eu disse, deixando claro que era a minha vez de usar exclamação.

Dez minutos depois, uma mulher, acompanhada do marido, apareceu com um Pug. O cachorro olhou desconsolado para nós, demonstrando um estado avançado de cansaço mental. Provavelmente, ele não agüentava mais seus donos ficarem tentando arrumar “amiguinhos” para ele. Tudo o que ele queria era dar uma volta em paz, mijar em uns dois ou três postes, voltar para casa e dormir no tapete. Eu e Besta-Fera reconhecemos um semelhante.

Sua dona, claro, não tomou conhecimento daquilo, tampouco do saco-cheio do seu cão. Besta-Fera e Pug começaram a se cheirar, sem muita empolgação, torcendo para aquilo acabar logo. A boçalidade começou logo:

– Ele morde?

Bom, ele é um cachorro. Seu único mecanismo de defesa são os dentes. O que você acha?

– Não. [suspiro].

Claro que eu poderia mentir, mas não ia mudar nada. A Besta-fera não é um cachorro que impõe muito respeito. Digamos que, num torneio de vale-tudo, ele estaria longe de ser considerado como favorito.

– O Lulu [não era esse o nome do coitado do Pug, mas lembro que era algo não particularmente masculino] também não!

E começou a rir de forma doentia, como se isso fosse suficiente para eles trocarem telefones, jantarem duas vezes por mês e trocarem cartões de Natal todo o ano. Besta-fera me olhou com cara de “podemos ir embora?” e o Pug me olhou com cara de “posso ir com vocês?”

Me despedi rapidamente e fui embora. Voltamos para casa, Besta-Fera bebeu água e deitou no sofá, com um olhar de “você tem razão, a sua espécie não deu certo mesmo”.

Então, quando você ver uma pessoa passeando com um cachorro na rua, observe atentamente as duas criaturas. Porque, na maioria das vezes, o verdadeiro animal é o que está sem a coleira no pescoço.

E, antes de ir embora, segue o Top 5 raças de cachorro que habitam Pinheiros, como um rápido passeio pode confirmar:

1. Lhasa-apso
2. Lhasa-apso
3. Lhasa-apso
4. Pug
5. Lhasa-apso

27 comentários:

O Frango... ® disse...

Morro de preguiça de sair com meus cachorros na rua. Eu tinha um Basset Hound muito lerdo. Além de parar de 30 em 30 segundos (por causa da falta de fôlego dela), todo mundo parava para fazer carinho. E, ao contrário da besta-fera, ela adorava. Quem não gostava era eu...


Só um detalhe... "e depois sai correndo me arrastando pela rua (algo que só o meu cachorro faz)." Pelas fotos, a besta-fera tem uns 30 cm, no máximo. Agora eu realmente sei quem é o dono da casa.

ótimo texto, como sempre!

Anônimo disse...

Ainda bem que na roça em que fica o meu bairro, só eu passeio com as minhas cachorras. O risco de me acontecer algo parecido é praticamente zero (praticamente, pq é preciso considerar que a humanidade não deu mesmo certo, e nunca se sabe o que pode acontecer).

Luna disse...

Você é que deve ter uma cara simpática demais, porque eu tive cachorro durante 6 anos e ninguém nunca vinha falar comigo... a única vez que eu me lembro foi um cara com pinta de galinha que sugeriu que os nossos cachorros cruzassem. Tô pior que você em termos de cantadas bizarras, né?

MaxReinert disse...

...pois.... eu também tive um basset (só que daschund!) e tinha meio que preguiça de passear com ele... até porque ele era bastante histérico.

Sabe aquele cachorro que fica andando meio de lado, fazendo força na guia pra ir sempre pro outro lado, não importa qual lado seja? Pois... esse era o meu!

E, pasme, eu também já ganhei uma cantada (chinfrim!!!) passeando com meu cachorro!

Anônimo disse...

O Frango:

Mundo pequeno. Um dos grandes amores da minha vida foi um basset-hount que tive entre os (acho) 9 e (acho) 18.

Luna:

Será que é minha cara? Duvido. Acho que é a Besta-Fera que é carismática demais.

Max:

Se eu recebi cantada passeando com o cachorro, fui lerdo demais pra perceber, como sempre. :-)

Chicletinha disse...

Qdo resolvo medir força com meu caozinho e tentar fzr um passeio agradavel com ele, sempre aparece um infeliz perguntando se eh um BUTERRIÊ.

Acredito que sinta a mesma repugnancia qdo perguntam se a Besta-Fera morde...

Gabi disse...

Prefiro gatos pois:
- Gatos não despertam simpatia (mas sim, incutem terror no coração dos incautos. É uma beleza, especialmente com gatos pretos. Ou com gatos que respondem quando você fala com eles. Enfim.)

- Gatos não saem pra passear

- Gatos não roubam meu aquecedor

Mas Best-fera é tão fofinho que compreendo a atração das pessoas por ele... =)

gilgomex disse...

Eu nunca saí para passear com um cãozinho (ou o cãozinho comigo). Não tenho cão! Não é que eu não goste, acho que é mais preguiça de cuidar mesmo. Já tive gatos. Sempre preferi gatos. Não precisa passear, até porque a única vez em que tive que levar um gato meu para o veterinário, meu pai, minha mãe e eu tivemos ferimentos sérios (arranhão no braço da minha mãe, arranhão e mordida de leve na minha mão direita e uma mordida que quase atravessou o dedo do meu pai).

PS : visitem o blog que mais têm falta de novidades na blogofera: www.thegilgomex.blogspot.com

Unknown disse...

Não dá pra sair com meu cão. Ele não para quieto. Só vive pra lá e pra cá.

Marcelo A. disse...

Cara, valeu pelo comentário lá no "Diz"!

Eu que tô impressionado com o seu blog... O layout, os textos, tudo... Coisa de profissional! Um dia eu chego lá!

Rsrsrsrs!

Vou te esperar mais vezes. Eu, com certeza, voltarei aqui.

Abração e sucesso!

Marina disse...

Se você - que é homem - acha ruim, imagina como é com uma mulher. Às vezes, o homem que para para conversar (maldita reforma ortográfica) nem precisa estar com um cachorro.

Arthur Alves disse...

"É menino, ou menina?"
kkkkkkk...

Eu tenho um ódio dessas perguntinhas viu... rs

Muito bom o post, cômico!
Parabéns pelo blog...

E por enquanto não posso confirmar nada sobre cães - não tenho um! rs

Abs

kbritovb disse...

hahahahah mto bom
cachorrinho tem telefone?
hahahah

P! disse...

Aaah, eu tenho uma preguiiiça de passear com a minha cachorra. E não nego que às vezes eu trato ela como uma criança. HAHAHA
Tadinha, acho que ela sofre na minha mão!
Você reclama tanto do Besta-Fera mas deve gostar dele demaaaaais, ainda mais pela cara de fofo que ele tem (vi pela foto de algum post pos aí)!

E valeeu pela volta do Top 5! Já tava com saudades!

Thiago Apenas disse...

"e depois sai correndo me arrastando pela rua (algo que só o meu cachorro faz)"

Você tem sorte, meu cão é um Golden Retriever de 25kg com 7 meses.Ou seja, quando ele quer me puxar, ele realmente puxa!

N. Araujo disse...

falarei para vovó, que tem um poddle em pinheiros, parar de falar com estranho na rua.

Viviane de Campos disse...

sempre vou passear com minhas bestas-feras (PORQ SÃO MESMO) e nunca ninguém me abordou... e olha q sou bonitinha...
vc deve ter uma cara amigável, e não deve demonstrar essa intolerância constantemente.... e a sua besta-fera tb deve ser bem simpática

Gabi disse...

Tenho um casal de daschunds.O macho é bem gordinho e todos na rua fazem qustão de me lembrar este fato com comentários sempre infames.
A fêmea é uma louca psicótica e anda igual ao cachorro do Max.

Cada passeio com eles (pelo menos duas vezes ao dia) é uma batalha.Normalmente eles saem vencedores.

;D

Unknown disse...

A daschund fêmea aí de cima é minha cadela e ela não é mais "louca psicótica" do que o macho. Mas uma coisa é verdade, normalmente eles saem vencedores na batalha diária do passeio

;D

Marina disse...

Opa, obrigada, Rob! Fiquei muito lisonjeada com seu comentário. E, a propósito, já linkei você lá.

Abraço!

Arthurius Maximus disse...

Tenho cinco pastores alemães. Quando eles me levam para passear é uma festa. O melhor de tudo é que não sofro com "surpresas caninas" espreitando e rosnando sorrateiramente... (rs)

Thiago Dalleck disse...

Coloca uma focinheira no Besta-Fera que aí eu quero ver alguém chegar perto. Se perguntar se morde, você ameaça tirar a focinheira, rs.

Persiolino disse...

Oi,
Qual a raça do Besta-Fera?
Ele morde? Que bunitinho hein...
hahahaha.

Kel Sodré disse...

Rá!
Rob, não comprei um Westie, mas comprei um Scottish Terrier. Tão aristocrata e tão atrevido quanto a Besta-fera parece ser!

Infelizmente, ele ainda não tomou a 3ª dose da vacina (aliás, como demoram a passar 3 meses para a gente poder sair pra passear com o cão!) então ainda não tenho experiências do tipo para compartilhar. Volte com um post sobre temas relacionados em aproximadamente um mês e eu já terei pitacos para dar!

Flavita disse...

Demorei, mas cheguei. Então, eu me identifico e não me identifico. Eu sou dessas pessoas que imediatamente quer fazer parte do clubinho "sim eu tenho um cão". BAsicamente porque aos 31 anos de idade é meu primeiro cão. Então, eu PRECISAVA entender melhor como funciona esse troço de 4 patas que NÃO veio com manual de instrução. Quando eu não tinha cão eu achava que todos os donos de cães se conheciam e que todos os cães se davam bem.

Agora que eu tenho um e que entrei no clubinho eu descobri que:

1. tem muito dono de cão que não gosta de cão
2. os donos transmitem suas neuroses para os pobres bichinhos

Logo, agora, eu passo a maior parte do tempo, como você, evitando conversas na rua ou na clínica. Mas de vez em quando é inevitável e até rolam papos legais.

O meu é - infelizmente - absolutamente simpático. Infelizmente porque ele quer socializar com todo mundo. E, quando ele era menor arranjou encrenca com a cã da vizinha (a cã mesmo e não a vizinha). E daí ele aprendeu a interagir...latindo (antes ele NUNCA latia). Isso significa que ele sempre late para outro cão. O que levou ao doloroso processo de adestrá-lo. E agora ele quase parou de latir para outros cães, só faz isso de vez em quando (ao ser ameaçado ou quando eu levo ele embora de alguma brincadeira, ahahaha).

Enfim, eu ri com o seu post, mas tenho que admitir que eu virei uma dessas pessoas ridículas que tratam o cão como um bebê. Eu falo que ele é meu filho, converso com ele na rua e pareço uma ridícula. Sim, você não me reconheceria. Nem eu me reconheço. Leia a matéria da Superinteressante, eles explicam tudo. Aparentemente eles fazem a gente produzir um hormônio xpto iguar que nem os bebês fazem.

ps: o meu é um vira-lata que bota o maior terror nos mini-cães das madames do bairro. Eu me divirto. "Ele morde?" "Só de vez em quando" Ahahahahaha!

Flavita disse...

Eu falei q ia ser um post e não um comentário.

Lari Bohnenberger disse...

Nem me fala que eu tenho uma raiva desta gente que anda com cachorro fora da coleira... ninguém merece!
A Coca, quando eu saio com ela, só me faz passar vergonha! É barraqueira, a cachorra, que só ela!
Bjs!