Esta semana foi corrida. Passei as tardes entrevistando candidatos a estágio aqui na redação. Se dependesse de mim, eu apenas receberia os currículos, escolheria uns dois ou três candidatos e marcaria as entrevistas, resolvendo tudo em apenas uma tarde – afinal, a grande vantagem de você ser o candidato a empregador é a possibilidade de jogar as entrevistas nos seus horários, e, se a pessoa não puder, azar o dela.
Infelizmente, acionamos duas empresas de estágios: uma delas apenas repassa os currículos; a outra, não apenas faz uma pré-triagem como já marca as entrevistas. Ou seja, na noite de sexta-feira eu descobri que, ao longo desta semana, eu já tinha mais de dez entrevistas marcadas. Essa semana, então, eu passei os dias resolvendo minha vida e as tardes conversando com candidatos ao emprego, estudantes de jornalismo do segundo e terceiro ano.
No começo, claro, é legal. Mas, no segundo dia, já começa a encher o saco ter que explicar de novo como é a revista, qual o tipo de pessoa que você precisa e quais funções ela terá lá dentro. Então, é inevitável que você ligue no automático – sério, nunca usei tanto as mesmas frases em tão pouco espaço de tempo como nesta semana.
Não sou especialista em RH ou em entrevistas de emprego, então, obviamente, me baseio pelo meu feeling. Passo os olhos no currículo, vejo qual faculdade estuda, quais idiomas ela fala. Mas o que importa mesmo é a postura da pessoa.
Uma menina chegou aqui, mal apertou minha mão direito, quase não abriu a boca durante a entrevista e evitava me olhar nos olhos. Ok, sou feio, mas sei que sou não repulsivo. Está fora. Outra, em compensação, fez exatamente o contrário. Mal me deixava falar, de tão preocupada que estava em mostrar que queria demais a vaga. Quase disse a ela que “o fato de você estar aqui já me mostra que você quer a vaga, não precisa forçar a barra”. Está fora também. Não vou contratar uma pessoa que fala mais que eu.
Gostei de alguns candidatos, especialmente os que fizeram perguntas. Perguntas não mostram que você não está entendendo; pelo contrário, mostram que você está acompanhando o que estou dizendo. Especialmente perguntas inteligentes.
Não precisa ser uma pergunta genial, que vá mudar o jornalismo brasileiro, mas, sim, uma pergunta válida, bem colocada. Se eu mostrar uma seção da revista e o sujeito falar “porque vocês não fazem isso de outra maneira?”, está fora; se eu mostrar uma seção da revista e a pessoa soltar um “parece legal”, está fora também. Um deles fez a pergunta mais eficiente de todas. No final da entrevista, perguntei se ele tinha alguma dúvida e ele me solta:
– Você não disse seu nome.
E não tinha dito mesmo. Merda de piloto automático.
Enfim, ainda não sei quem vou contratar. Tenho algumas pessoas em mente, mas ainda vou ler os textos deles, como próxima triagem. Mas ainda tenho três entrevistas pela frente, vamos ver.
Mas o que me chama atenção é a postura que todos eles entram aqui. Você nota claramente que eles não sabem direito o que esperar desta situação; não sabem se te chamam de senhor ou de você, ou se perguntam quando pinta uma dúvida, ou se esperam eu terminar de falar. Não sabem se vão pela formalidade ou tentam mostrar que estão se sentindo confortáveis.
Eu, obviamente, tento colocar todos à vontade, ofereço café, água, e, no começo da entrevista, solto uma piadinha leve para a pessoa relaxar um pouco – algo que deu certo na maioria das vezes.
Mesmo assim, eles entram aqui não como profissionais, mas, sim, como crianças no primeiro dia de aula. Todos eles querem muito o estágio – isso é óbvio – até mesmo para poder decolar na profissão que escolheram ou, ao menos, ver que a área escolhida foi a correta (mas vale lembrar que se trata de uma carreira que eles escolheram com 16 ou 17 anos, ou seja, sem idade ou maturidade para isso). Sendo assim, eu me interesso pelos candidatos que conversam naturalmente comigo. Claro, um pouco de nervosismo é aceitável, mas é só.
Mesmo porque nervosismo não é culpa deles.
Partindo do princípio que a faculdade pode ser considerada como um curso profissionalizante, de nada adianta ensinar apenas as bases da carreira. Teoria e história da comunicação são matérias (razoavelmente) importantes; ética, claro, é vital; fotografia e vídeo, por sua vez, são apenas divertidos caso a pessoa pretenda passar o resto da vida dentro de uma redação escrevendo matérias. E, claro, ensinar técnicas de redação é algo essencial.
Agora, custa dar dicas sobre mercado de trabalho, ao invés de tentar vender a idéia de jornalismo (ou qualquer outro curso de comunicação como arte?). É ridículo você promover palestras sobre um jornalista que cobriu a guerra do Iraque para um grupo de estudantes que não sabem como pedir um emprego – afinal, para cobrir a guerra do Iraque e entrar para a história, você precisa ter um veículo que irá publicar a matéria. E isso não se consegue sem um emprego, que, por sua vez, não se consegue fazendo uma entrevista de emprego de merda.
Então, acho que mais importante que saber a importância de Robert Capa para a história do fotojornalismo é saber como conseguir um emprego dentro da área que você escolheu. E, infelizmente, as faculdades de jornalismo, pelo que estou vendo, não cumprem esse papel, sem mostrar aos seus alunos não apenas como se comportar numa entrevista de emprego, mas também sem ensinar como montar um currículo atraente ou abordar temas como “que tipo de pessoa uma redação precisa”. Custa colocar palestras e cursos sobre isso, sem interferir com a grade normal?
Faculdade é, sim, algo muito legal de ser feito, não apenas pelos conhecimentos adquiridos, mas pelo próprio ambiente acadêmico (e não falo aí de boteco, falo de pesquisa, de inovação, de desenvolvimento de criatividade).
Mas, a faculdade é, antes de qualquer outra coisa, uma formadora de profissionais. E, pelo que estou vendo, ela não se preocupa muito com a profissionalização desse futuro profissional, mas sim com o glamour dos cursos escolhidos.
E, acreditem na opinião de alguém que está no mercado de trabalho já há alguns anos: glamour não enche barriga nem paga aluguel.
21 comentários:
pqp Rob, juro q pensei em parar de ler o texto no primeiro parágrafo... maldita geografia!
(daqui a pouquinho volto, depois de ler o resto)
Rob, num mercado de jornalismo extremamente fudido como o daqui de Pernambuco qualquer dica de mercado de trabalho é perigosa para o Professor que está dando, que corre o risco de perder seu empreguinho para um novato.
Isso aqui em Recife é uma realidade, não uma excessão. Por isso que assim que formar vou pra Sampa trabalhar com você =P
O esquema dentro de uma faculdade é bem parecido com o que você falou. Saber as teorias e como a comunicação é pensada é ótimo. Mas uma coisa que eu sinto falta no meu curso (estudo na UFMG) é a falta de vivência prática. A maioria dos professores nunca pisou dentro de uma redação. Aí as aulas acabam sendo teóricas demais e ninguém consegue ficar minimamente preparado para o mercado.
É claro que eu defendo que deve-se passar pela faculdade antes de exercer a profissão, principalmente por causa do ambiente acadêmico (que você citou no seu texto). Mas se continuarem dando enfoque apenas ao teórico, vamos continuar chegando nas entrevistas muito crus, como seus candidatos...
Ok. Otávio e o Frango já falaram o que eu queria dizer, mas reforço assim mesmo.
Merda de geografia! Mas, Rob, ainda acho que você poderia ter contado para nós, leitores do Champ e estudantes de Jornalismo, que estava selecionando estagiário. Eu me aventurava...
Outra coisa: como o Frango, também estudo na UFMG. Estou no 9º período (sei que o curso só tem 8, mas essa é outra história) e, sinceramente, já desisti de ser formada para o mercado dentro da faculdade. Às vezes, até concordo com o fato de a faculdade não ser tão prática. Mas tenho plena consciência de que isso é a filosofia da raposa e das uvas.
O que deveria mesmo ser feito, era um outro currículo, com carga horária maior e mais eficiente. Poder pensar o Jornalismo e discutir as novas tendências e correntes que estão surgindo nos últimos anos é fundamental. Mas isso deveria ser feito em um contexto de prática do Jornalismo. Deveríamos ter laboratórios para a prática da profissão e fazer reflexões teóricas em cima do que fosse produzido nas aulas, pelos próprios alunos.
Agora, uma outra observação (foi mal, gente, sei que estou me estendendo muito no comentário...). Há uns três semestres tenho me dedicado exatamente mais ao meu estágio do que ás matérias na faculdade, até porque agora estou em fase de elaborar projeto de conclusão de curso. Um dia, em uma aula que resolvi fazer, ouvi algumas coisas sobre o tal do jornalismo público e fiquei abismada. Senti a falta que faz estar ativamente na Universidade, participando dessas discussões que podem, de fato, mudar os rumos do Jornalismo que a gente faz todos os dias. Só para dar o contraponto à ideia que a universidade não fornece o tanto de prática necessária, acho que, por outro lado, o mercado também tem uma carência enorme de espaços onde a prática possa ser pensada, avaliada e transformada de acordo com as necessidades impostas pelos contextos. Não deveríamos parar de acompanhar e produzir teoria quando entramos para o mercado. Ao contrário, com a experiência adquirida na rua, deveríamos construir mais conhecimento, para enriquecer a área.
Pronto, acabei.
aah, levei um tempão pra elaborar uma resposta que é idêntica à da Kel (que, não por acaso, é minha companheira de projeto de conclusão de curso no Jornalismo da UFMG - sim, somos todos conhecidos) ehhe. Pois é, é o que eu penso também.
só insisto em comentar: primeiro! e quinto!
Eu não posso falar sobre faculdade ou entrevistas de emprego porque nunca tive a experiência de ambos, mas estou prestes a ter que escolher em qual universidade vou ter que ingressar e qual curso eu vou fazer (e não tenho a menor idéia de nenhum dos dois), e adimito que ler esse post aumentou um pouco o medo grande que eu já sinto. Mas prometo que vou me lembrar das dicas soltas que encontrei por aqui.
Ah é, caso interesse, tem um selo pra você no meu blog. :)
Infelizmente, as faculdades nunca preparam o profissional para esse detalhe insignificante que é procurar emprego.
E como nem todos têm o seu jogo de cintura nato, sinto pena dos seus candidatos e de todo esse pessoal que está na faculdade aprendendo procedimentos que nunca serão aplicados aqui fora.
Mas seja exigente sim, você é quem terá que aturar o cidadão todo dia no trabalho.
Beijo
Sil
Cara achei super interessante a ideia defendida, mas terei que discordar: no mercado de trabalho que todos tiverem o mesmo certificado, resta como critério de coação os com posturas adequadas em todos os âmbitos - inclusive no ato da entrevista.
Sobre o jornalismo, está embaçado a questão da obrigatoriedade do diploma no STF.
Mas enfim, gostei do post, faltou umas piadinhas... haha.
Abraço!
Só não vale dizer: "Quem comentar mais e melhor no meu blog tem a vaga garantida" hahahaha
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Hoje colocaria no meu currículo que tenho um blog, embora alguns posts seriam prejudiciais...
A questão das perguntas (inteligentes) reflete aquilo que você colocou no Twitter: leitura, leitura e leitura.
Nas 'areas mais técnicas, a coisa fica ainda pior (acredite!).
Abraços!
Triste saber que as universidades continuam como eram quando eu frequentei, há mais de 10 anos. O que eu via ali eram professores obsoletos, que não atuavam na área que ensinavam (professor de rádio trabalhava na televisão e em revista e assim por dianre) de modo que não podem passar experiência se não as tem.
Também tive dificuldade de escolher estagiários para a redação. Sempre segui o meu feeling e deu certo. Hoje eles não estão mais comigo, mas acompanho o crescimento dentro da carreira e fico feliz, principalmente porque vi aquela pessoa quando começou a escrever.
Vi que os comentários aqui são de pessoas que ainda não terminaram a faculdade. Ora, não é motivo de desespero. Mas sim momento de aproveitar a chance e, com essas dicas, tirar o melhor proveito do estágio e da entrevista. (eu, por exemplo, não tive dica nenhuma... até porque internet naquela época era algo que... bem, deixa pra lá!)
Mas Rob (vou entrar na onda), se desistir de contratar estagiários, tô aqui! =)
Eu larguei a faculdade de jornalismo no primeiro semestre, quando a professora de gramática disse "Poblema"... Ok, nem foi só isso, o curso era fraco, ruim e não preparava nem um babuíno pro mercado de trabalho. Redação tem um ritmo muito mais frenético.
Se quiser alguém que escreve bem e que aceita ganhar o que ganha um estagiário, estou aqui! Hahahaha (todo mundo pedindo emprego pelos comentários!)
Faculdade de jornalismo é fruto do lobby de espertalhões para arrumar algum e fazer reserva de mercado. O mais curioso é que a maioria dos grandes jornalistas estudados sequer tem curso superior.
Se um canudo desse competência para alguém; os funcionários do Mc Donald's seriam neurocirurgiões ou cientistas de foguete.
Ainda bem que, muito em breve, essa aberração deve acabar.
para mim o estágio que fiz foi muito mais importante que a faculdade, aprendi muito mais com meu chefe do que com alguns professores...
queria ter continuado a graduação, sem me formar, só para continuar no estágio.
falou e disse. da proxima vez coloca esse testo como pre-requisito pra ir pras entrevistas, pode ajudar alguns deles a desistir ou nao falarem mais do q vc... hehe
Pronto Rob.
Paguei a dívida que eu tinha com o Champ...li tudinho xD
desde antes do show do Kiss xD
Eu não gostava muito da faculdade que eu tava fazendo (licenciatura em História, larguei esse ano), mas uma coisa eu sempre gostei é o fato de a gente ter aulas práticas desde o primeiro semestre. Evitava o drama super comum de a criatura chegar na sala pra dar a primeira aula sem ter a menor ideia do que fazer (e arrancar os cabelos qd percebiam que a prática era totalmente diferente da teoria).
Mas isso tava pra ser revisto. Muitos professores reclamavam, dizendo que a prática tirava espaço de "matéria importantes", que tinham que ser dadas em pouco tempo. Quer dizer, pra eles era mais importante formar alunos com "conteúdo" do que alunos preparados pro mercado de trabalho. Triste, mas essa era a mentalidade...
Nem sou da área de jornalismo, mas também sinto que isso ocorre na minha área!
Muito bom texto... Concordo em gênero, número e grau!!!
cara... até hoje (e eu nunca fiz faculdade, ou pelo menos nunca terminei) tive sorte pra conseguir empregos. Pois consegui à distância, já que eu gravo um piloto e anexo junto com um currículo e envio... Rádio é assim, ou o chefe gosta da voz do cara, ou não. Mas realmente, creio que área do jornalismo seja bem mais exigente (e tem que ser), afinal alguém tem que fazer uma faculdade e depois esse alguém vai ter que entrevistar, que conhecer, que escrever e muitas outras coisas que deixam a pessoa em certas situações dificeis pra quem só "Oi, uhum e tá legal!"
E eu estou dizendo isso sem conhecer na prática, mas sei na teoria que temos profissionais na área aqui no sul... Que não passariam pelos eu crivo... Não mesmo.
Aplausos!
(tô com pressa, tenho que passar o dia com as misses, depois penso em um comentário decente)
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