21 de dezembro de 2008

Jim Morrison e o Maníaco do Táxi - Parte II

(leia a primeira parte aqui)


Ele ficou em silêncio, por alguns segundos. Eu percebi que isso me deixava mais assustado do que quando ele estava falando. Começou a tocar (Break on Through) To Oher Side e eu comecei a ficar realmente preocupado com a possibilidade do sujeito se empolgar com a música, puxar qualquer objeto de metal do bolso e dar um break on through to the other side no meu olho.

Ou não.

Quem sabe tudo que eu tinha que fazer era ficar quieto e não tocar no assunto “praia”, e tudo acabaria bem. Talvez, com sorte, esta conversa já tivesse se perdido em algum lugar no labirinto que existia dentro daquela mente desequilibrada. O problema é que os conceitos “sorte” e “Rob Gordon” não costumam caminhar juntos. Ou seja, logo em seguida ele trouxe o assunto à tona.

– Você não gosta de praia?, e me encarou fixamente, como se estivesse me questionando sobre eu ter espalhado boatos a respeito da irmã dele pela vizinhança.

Engoli em seco e tentei responder da forma mais diplomática possível.

– Olha... Gosto. Acho bem legal. É que estão me esperando lá em Moema, eu já tinha marcado, sabe? Mas eu gosto mesmo de praia, viu?

– Não, não é hoje que você vai para a praia!, ele deu uma gargalhada que fez meu sangue gelar. Agora era oficial: eu não sabia se tinha mais medo quando ele estava em silêncio ou falando.

– É que se você quiser ir para a praia, eu alugo uma casa ali, ele continuou, depois de parar de rir.

– Ah.

– 40 paus para ir, 40 paus para voltar. E a casa é de graça.

De graça? Imagina o cafofo que deve ser.

– Ah.

– Se você quiser, é só falar comigo.

– Ok.

– Puta idéia, né? O pessoal paga só 80 contos e passa um fim de semana na praia. E eu levo e busco.

– Sim. Baita idéia.

– Mas só pode ser dois casais.

Pensei em perguntar a razão dos dois casais – afinal, a corrida deve custar 40 paus, independente do número de passageiros, já que a distância é a mesma – mas achei melhor ficar quieto, temendo que tivesse algo a ver com swing. Era só o que faltava: ele era um psicopata versátil, que, entre um ritual de magia negra aqui e mandar cartas escritas com sangue para a polícia ali, administrava uma casa de troca de casais na praia. E, para piorar, não seria das melhores, já que o preço era bem baixo e só admitia dois casais – o que, matematicamente, não permitia muitas combinações. Talvez fosse algo com um ambiente mais romântico e intimista, uma espécie de casinha de swing de sapê.

Meus pensamentos foram interrompidos pelo toque do meu celular, avisando que mais uma mensagem dos meus amigos havia chegado. Fingi que estava respondendo e usei isso como desculpa para ficar quieto.

Aparentemente, ele ficou satisfeito. Ou, ao menos, em silêncio.

Isso até ele entrar na Avenida Brasil e colocar meio corpo para fora do carro (sem diminuir a velocidade do automóvel), olhando alguma coisa no céu. Eu comecei a rezar baixinho. Quando ele entrou novamente no carro, estalou os olhos na minha direção e perguntou:

– Você viu a Lua hoje?

– Não.

– Olhe, ele respondeu. O tom de voz que ele usou condensava todas as ameaças de morte conhecidas em apenas quatro letras.

Eu olhei pela janela e vi que, realmente, a Lua estava linda. Mas óbvio que não dei muita atenção para isso, estava mais preocupado procurando uma viatura da polícia na rua. Ele continuou:

– A Lua, quando está cheia assim, me deixa louco.

(Neste momento, o pedaço do meu cérebro que ainda insistia em acreditar que nada demais aconteceria comigo e que essa história iria parar no meu blog alguns dias depois, percebeu a gravidade da situação, gritou “Meu Deus! Nós vamos morrer!” e saiu correndo para se esconder dentro de um armário.)

Bom, é isso, pensei. Eu vou ser morto em questão de minutos. Não há muito o que fazer. Merda de Lua. Logo, vai começar a tocar The End, ele vai puxar uma furadeira e enfiar no meu ouvido, e depois vai sair dirigindo pela cidade, todo sujo de sangue e com o meu cadáver ao lado, ouvindo People Are Strange no máximo.

– A Lua me deixa louco, ele repetiu.

– ...

– Adoro a Lua. Me deixa louco.

– Ah.

Comecei a elaborar um plano de fuga. Como eu estava a 3 quadras da igreja Nossa Senhora do Brasil, e o sinal ali está sempre fechado, eu teria tempo para abrir a porta do carro e sair correndo, procurando abrigo na igreja – talvez sob o altar ou na sacristia. Respirei fundo e me preparei. Coloquei a mão no bolso, me certifiquei de que a carteira estava firme, a chave de casa também, e comecei a me preparar psicologicamente para o sprint da salvação. O carro foi avançando, e ele alternando o olhar entre a Lua (45%), eu (45%) e os carros à frente dele (10%).

Mais alguns segundos, e eu estaria livre disso.

Ou não, já que como eu sou eu, o semáforo à frente da Igreja estava verde pela primeira vez na história do município. Aposto que os jornais noticiaram isso no dia seguinte. Todo meu plano de fuga foi por água abaixo. Jim Morrison começou a cantar Love me Two Times e ele aumentou o som do carro. Minha única alternativa, agora, esperar alguns minutos, sair correndo do carro e pular para dentro do Parque Ibirapuera. Mas descartei a idéia na mesma hora, porque se eu pulasse para dentro do parque depois das 8 da noite, o máximo que eu conseguiria seria sair dali sem carteira, sem relógio, sem celular e grávido.

Resignado, respirei fundo e resolvi aceitar meu destino.

(continua...)

21 comentários:

MaxReinert disse...

huahauhaua.... salta! Salta.. não perde a chance!!!!

PS: Eu deveria dizer "Primeiroooo"?

P! disse...

Sacanagem, eu quase fui a primeira!
Quando eu cliquei nos comentário tava "0".

Esse "continua" me deixa louca.
HAHAAHHAHAHAHAHAHA

Lari Bohnenberger disse...

Aiê!
Puta merda! Eu tô louca pra saber como termina esta história!
Tu vai postar a próxima parte logo, né?
Tô muitíssimo curiosa! Te matar já deu pra ver que ele não conseguiu (ou seria esta uma saga psicodatilografada?), mas quero saber se tu foi corajoso a ponto de pular, ou se tu foi corajoso a ponto de ficar no taxi até o fim da corrida! De qualquer maneira, tu é muito corajoso, Rob!
Rssss!
Bjs!

Lari Bohnenberger disse...

Devo ser a única das leitoras de fé daqui que nunca foi a primeira a comentar... buáááááá!
Tá, tô querendo enganar a quem? Pra ser a primeira é necessário agilidade, coisa que eu não tenho!

Talita disse...

Pô, eu achei o taxista gente boa até...

Anônimo disse...

Olha, eu - particularmente - não recomendaria o Ibirapuera (nem mesmo durante o dia) para quem está sendo alvo de um maníaco :)

A seleção de Doors é das boas, disso não se pode reclamar. Ele ser um apreciador da lua também não é nada mal... Agora o que me interessa mesmo é saber de que psicotrópico ele é usuário.

Será que pro Ano Novo a casa na praia tá livre? Pô, 80 contos, compensa.


Vontade danada de ler tudo de uma vez.

Perci Carvalho disse...

"o máximo que eu conseguiria seria sair dali sem carteira, sem relógio, sem celular e grávido." aiuhieahiae lendo essas historias suas... eu percebo q nao tenho só odio dessa cidade sua,... tenho MEDO tb!!!

Perci Carvalho disse...

"o máximo que eu conseguiria seria sair dali sem carteira, sem relógio, sem celular e grávido." aiuhieahiae lendo essas historias suas... eu percebo q nao tenho só odio dessa cidade sua,... tenho MEDO tb!!!

Tyler Bazz disse...

Começo a desconfiar que toda a discografia do Doors foi escrita pensando em você...

Mas ow.. sério.. vou me adiantar aqui porque o fim da história pode mudar isso, mas deve ter pelo menos uma meia-duzia de taxistas (ou outras pessoas que trabalham à noite) que aprontam dessas pra zoar a galera. Você pode ter sido a piada da noite no ponto de táxi. :D

Anônimo disse...

"Talvez, com sorte, esta conversa já tivesse se perdido em algum lugar no labirinto que existia dentro daquela mente desequilibrada"

Clichê, hein, R.R.?

Thiago Apenas disse...

"o máximo que eu conseguiria seria sair dali sem carteira, sem relógio, sem celular e grávido."

Gravido???Muito errado isso! o0

Droga de continua...

Kel Sodre disse...

Querido Papai Noel,
este ano fui uma menina muito boazinha, me comportei bem e não briguei na escola.
Gostaria de fazer um pedido ao senhor: neste Natal quero ganhar o final desta mais recente saga do Rob Gordon em seu blog, o Championship-Vinyl.
Obrigada!

Varotto disse...

Cara, sem dúvida nenhuma, uma de suas melhores histórias!

"casinha de swing de sapê" foi um toque de gênio...

Karina disse...

Muito bom!
bj

Larissa disse...

Querido Rob...

Não faça mais esses textos em forma de folhetim: ou você escreve tudo de uma vez, ou guarda a história pra ti!

É muita sacanagem: agora vou ter que esperar sabe-se lá quanto tempo pra saber qual foi o desfecho da história do taxista louco!

Tens noção de que isso pode comprometer a minha noite hoje?

Renan Becker disse...

huhsaus ameaça de Morte ao som de The Dooors auhsuah
Escreve o fim logo!!

Perci Carvalho disse...

cadê o resto? cadê o resto? cadê o restoooo????

Barlavento disse...

Rob Gordon: A Sherazade contemporânea...

O Lerdo disse...

auhauhahuhauahuahahuahu se o taxista não deu cabo de vc, parece que seus leitores o farão.

Mas cara, vc passa por cada coisa que faz eu me sentir o cara mais sortudo do mundo. E olha que isso não é pouca coisa não rs.

Lucas L. disse...

Hahaha, demais a estória. (y)

Mas olha só, eu tenho uma teoria sobre o porquê dele só levar 2 casais: como ele disse, ele não cobra a casa, só cobra a ida e a volta. logo se fossem mais do que 5 pessoas (os dois casais mais ele), o desequilibrado teria que fazer rotas a mais... =P

Varotto disse...

... ou ia ser trabalho demais para um fim de semana só. Eviscerar e fatiar mais de quatro deve levar muito tempo.