27 de dezembro de 2016

A Princesa que Corria por Trás dos Carros

Quando eu criança, nós brincávamos de Guerra nas Estrelas. Sim, porque no começo dos anos 80, o nome era esse: Guerra nas Estrelas. Então, sorteávamos os papeis. Alguém era o Luke Skywalker e empunhava um sabre de luz feito com um cabo de vassoura; outro era o Han Solo, com uma pistola de plástico; o resto era o pessoal do Império (não tínhamos uma turma grande o suficiente para escalarmos wookies e robôs).

Normalmente, o objetivo da brincadeira era resgatar a Princesa Leia, que estava presa em alguma garagem transformada em Detenção da Estrela da Morte. Então, Luke e Han derrotavam os soldados imperiais e salvavam a princesa.

Fim da história? Não.

Pois aí chegava o momento de tentar alcançar a nave espacial para fugirmos de verdade. A tarefa não era fácil: a nave era o carro do pai de alguém que ficava em outra garagem, do outro lado da rua e algumas casas abaixo. E todos os soldados do Império já estavam em pé novamente.

Mas, dessa vez, os rebeldes eram três, pois a Princesa também estava armada e lutava de igual para igual com os meninos ao seu lado – muitas vezes, liderando o caminho; em outras, se aventurando sozinha por uma rota alternativa (que normalmente ficava atrás dos carros estacionados). Não era difícil ela derrubar mais inimigos que seus parceiros.

E a história sempre acabava bem. A nave entrava no hiperespaço e todos iam para suas casas, tomar banho e jantar.

Acho que posso dizer que eu não cresci com esses filmes, mas sim que eles me ajudaram a crescer. Quem me conhece, sabe que esses filmes me acompanharam pela vida inteira. Não só os filmes, mas os livros, os jogos, os quadrinhos. Outros universos surgiram, mas este – especialmente aquele, dos três primeiros filmes – sempre esteve ao meu lado. Ao lado dos meus pais. Ao lado do meu irmão. Ao lado da minha Esposa. A Força sempre foi forte na minha família.

De garoto apaixonado pela Princesa – e qual garoto dos anos 80 não foi apaixonado por essa Princesa? – e que sonhava em destruir a Estrela da Morte, me tornei um adulto que entende melhor o significado da Princesa, de sua luta e do Império. Quando comecei a entender melhor os personagens – e as transformações pelas quais eles passavam – os filmes se tornaram mais ricos. E à frente dessas transformações estava a Princesa.

Quando Luke Skywalker ainda estava preso na casa dos tios, ela lutava. Quando Han Solo ainda estava preocupado apenas consigo mesmo, ela lutava. É ela que move todas as engrenagens. É ela quem move as peças de forma que o fazendeiro vire guerreiro e que o contrabandista se transforme em herói.

Isso se reforça no filme novo. Quando o guerreiro se exilou, ela continuou lutando. Quando o herói voltou a ser bandido, ela continuou lutando. Tanto nos anos 70 ou agora, no século 21, sempre que a luta daquele pequeno grupo de guerreiros começava a ser perdida era ela quem mantinha o ideal vivo. Como Princesa, como Senadora, como General, era ela quem carregava o piano.

Ela lutou muito nos bastidores. Mas lutou ainda mais em primeiro plano. Foi caçada implacavelmente pelo maior vilão da galáxia e não esmoreceu ao ver seu planeta explodir. Transformada em objeto sexual pelo gangster mais temido da galáxia, não esperou pelo resgate, mas por uma única chance de mostrar que não se curvava a ninguém – e demonstrou isso o matando com suas próprias mãos.

Ela deixou uma marca enorme em uma galáxia muito, muito distante.

Hoje, essa galáxia está um pouco mais silenciosa. Mas, em alguma rua da minha infância, ela ainda está lá, correndo por trás dos carros estacionados junto com o contrabandista, ou se aventurando corajosamente pelo meio da rua, ao lado do Jedi. Abrindo caminho no meio de meninos que fingiam ser soldados do império. Disparando com sua pistola de plástico. Não desistindo nunca.

E mostrando, a cada passo, que a esperança é uma arma mais poderosa que uma estação espacial que destrói planetas inteiros.

Estamos falando de uma princesa que lutou até o final.

Estamos falando de uma princesa que, na minha infância, lutará para sempre. 

10 comentários:

Anderson Heiz disse...

Nossa geração de nascidos na década de 70 foi impactadas pelo filme de George Lucas. Guerra nas Estrelas tornou-se um fenômeno mundial e transformou espectadores e eternos apaixonados pela saga, ainda mais para àqueles que conhecem a Jornada do Herói difundida por Joseph Campbell e utilizada no roteiro por Lucas. A princesa Leia vai ficar guardada para sempre em nossos corações!

Elise disse...

Ela se tornou uma com a Força :)

Unknown disse...

Grande Rob, um bom tempo que não comento aqui, mas sempre lendo seus textos. Parabéns, me emocionou muito, também brinquei muito assim e com a maturidade também pude entender que ideal e ideologia não são bem a mesma coisa e que o mundo hoje carece de ideais como o da princesa, já que estamos lotados de ideologos, que não lutam, apenas entram em um barco que alguem está conduzindo. Forte abraço!

Unknown disse...

E tem gente que fala que Star Wars não teve personagens femininos fortes até o episódio VII. Não entendo.

Anônimo disse...

Vc é um Desgraçado me fazendo marejar... Puta merda

@kosmidis

Leonardo disse...

Só terminei de ler agora. Confesso que fiquei triste com a notícia também. Esse saudosismo sempre me faz lembrar o quanto a fantasia é importante para uma criança, e como sonhar com estes personagens me fez crescer como pessoa também.
Sou de uma época onde admirava a Princesa Leia e a Tenente Comandante Nyota Uhura. Mas além delas posso listar ainda nomes como Tenente Ellen Ripley, Sarah Connor, a cientista Zira, Trinity e Dana Scully. E da literatura, minhas personagens preferidas são sem dúvida Ellen Arroway e Susan Calvin.
Eu sempre fui a favor da igualdade de gênero, e sempre apoiei o feminismo enquanto ele defende este ideal. Acontece que de um tempos pra cá tenho visto o gênero ficção científica sendo nomeado de Machista, Misógino e Heteronirmativo. Justo ele, que produziu personagens femininas tão fantásticas.
Desde que eu passei a produzir conteúdo na internet eu já fui chamado destes mesmos adjetivos pejorativo. Uma das vezes inclusive ao elogiar a personagem Imperatriz Furiosa do novo Mad Max. Ao tentar aprofundar da discussão, percebo que aqueles que reclamam da falta de representatividade, nunca leram Mary Shelley, Ursula K Le Guin e Ayn Rand.

Sou muito grato a tudo que aprendi sendo fã de ficção científica e Star Wars foi sem dúvida uma das principais portas de entrada. Mas ainda acho que apesar das histórias maravilhosas que temos, como sociedade ainda precisamos progredir muito.

Obrigado por tudo Carrie Fischer. A força estará contigo sempre.

Obrigado pelo saudoso e sensível texto sobre nossa nobre princesa, Rob.

Sds
Leonardo Carnelos

Unknown disse...

Esse seu texto me emocionou muito (pra variar). Obrigada por escrever, obrigada por falar sobre ela. Mesmo.

Unknown disse...

Esse seu texto me emocionou muito (pra variar). Obrigada por escrever, obrigada por falar sobre ela. Mesmo.

G R Machado disse...

Lindo texto Rob!
Sou bem mais novo (de 88), mas ainda lembro de assistir Uma Nova Esperança na Sessão da Tarde na primeira metade da década de 90. Inspirado pelo filme, lembro de pegar os EPIs de meu pai (capacete, óculos de proteção e luvas), entrava numa caixa grande e brincava de piloto de X-Wing.
Quando pensamos em Star Wars, tenho ótimas lembranças da minha infância e hoje sinto uma tristeza, muito maior do que outras personalidades de nos deixaram este ano, pois Carrie Fisher fez parte da minha infância como a eterna Princesa Leia.
Obrigado por esse belíssimo texto!

Sil disse...

Fiqueimuito triste com a notícia da morte dela mas foi com seu texto que me lembrou o quanto eu admirava esta princesa que resgatou seus salvadores, que eu chorei.