Eu tenho problemas com a pizzaria aqui ao lado.
Quer dizer, na verdade, a pizzaria aqui ao lado tem
problemas comigo. Ou melhor, com o resto do mundo. E como eu estou no resto do
mundo, os problemas se estendem a mim.
Assim que vim morar na Vila Mariana eu desconfiei que a
pizzaria não fosse das melhores. Porque o nome dela...
Bem, vamos colocar desse jeito: quando eu passei em frente à
pizzaria pela primeira vez e vi o nome, fiquei espantado. Precisei de alguns
minutos para entender a “sacadinha” do nome do lugar – que tem a ver com a
quantidade de recheio, acredito – mas que acaba servindo involuntariamente para
descrever alguns de seus funcionários.
Não. Não vou dizer o nome da pizzaria.
Mas vou contar como o lugar funciona. Você pede a pizza – por
telefone é mais fácil, já que sempre que decido ir até lá pedir pessoalmente eu
não consigo me comunicar com as meninas do caixa porque elas ficam assistindo
novela com a televisão no volume 7894 – e espera entregarem em casa.
Igual a uma pizzaria normal, certo?
Não. Porque sempre vem algo errado. Sempre. Acontece com
tanta frequência que eu acho que não é acidente, mas sim política da empresa. Às
vezes, acontece com a cebola e azeitona. Eu sempre peço a pizza com muita cebola
e muita azeitona – quando é a Esposa que pede, eu fico dando pulinhos ao redor
dela, sussurrando “não esquece! muita azeitona!”.
Só que o “muita azeitona” lá pode ser interpretado de duas
formas. Como são duas meninas que atendem o telefone, cada uma lida com meu
pedido de um jeito. A primeira delas entende que “muita azeitona” significa, na
verdade, que eu não quero azeitonas.
Assim que ela desliga o telefone, a expressão “muita
azeitona” começa a percorrer um caminho tortuoso pelo seu cérebro, se perdendo
no meio do caminho e sofrendo mutações antes de chegar à boca. É mais ou menos
assim:
Meia calabresa meia
portuguesa muita azeitona. Meia calabresa meia portuguesa muita azeitona. Meia calabresa
meia portuguesa muita azeitona. Ih, rapaz, esse capítulo da novela hoje tá uma
enrolação. Meia calabresa meia portuguesa azeitona. Meia calabresa meia
portuguesa azeitona. Ah, não dá bola para ele! Ele é apaixonado pela cunhada. Mulher
burra! Meia calabresa meia portuguesa meia azeitona. Meia calabresa meia
portuguesa meia azeitona.
- Zé! Tem um pedido aqui! Meia calabresa, meia portuguesa,
meia azeitona!
- Mas aí tem três metades!
- Ah, é?
- É. Tem que tirar uma.
- Ih, agora não sei qual tirar.
- Não tem pizza de azeitona! Essa aí que deve estar errada.
- Ah é! Então é isso! É meia calabresa, meia a outra que eu
falei.
- E a azeitona?
- Não, nada de azeitona. Meia calabresa, meia a outra lá.
Já a outra atendente interpreta o meu “muita azeitona de
outro jeito”. Para ela, toda vez que eu peço:
- Com muita azeitona, por favor.
Na verdade, eu quero dizer:
- Eu tenho uma doença rara e preciso comer 35 quilos de
azeitona por dia. Se isso não acontecer, as células do meu corpo vão explodir e
vocês serão responsabilizados. Sim, eu sei que devia abrir o jogo com você, mas
acontece que minha família não sabe que eu tenho esta doença e eles estão aqui
ao lado. E eu amo muito minha família, eu realmente quero comer uma pizza sem explodir
no meio da mesa de jantar. Minha vida depende de você. Eu preciso de azeitonas.
Ou seja, quando a pizza chega, eu não tenho pizza, mas sim
uma versão moderna do Monte das Oliveiras. Vou até o vizinho, peço uma pá e volto
para casa, disposto a abrir um túnel no meio das azeitonas até chegar à pizza.
Às vezes, descubro que nem pizza tinha, eram apenas azeitonas mesmo.
Mas eu ainda não falei do problema que a pizzaria inteira
tem com as bebidas. Aqui em casa nem se pensa a bebida que será pedida: é Coca
Zero. A Coca Zero não é apenas uma bebida, ela é parte integrante do ritual da pizza.
Mas nesta pizzaria isso não parece ser entendido. Peço a
pizza, espero alguns minutos e toca a campainha. Vou atender.
- Sua pizza chegou.
- Obrigado.
- A bebida eu não trouxe.
- A bebida você o quê?
- Eu não trouxe. Não tinha Fanta Zero.
- Puxa, que pena.
- Né? Seu troco.
- Então, mas é uma pena que não tem Fanta Zero e é uma pena que
isso não interfere com meu pedido. Porque é uma pena que eu pedi uma Coca Zero.
- Não tem também.
- Não?
- Não. Fanta só tem a normal.
- Sei. A Fanta preta tem?
- Como?
- Aquela bebida preta. Acho que é Fanta Jaboticaba. Sabe?
- Cara, bebida preta ali só tem Coca.
- Ah, é? Poxa... Que pena. Mas tem Zero?
- A Coca?
- Isso.
- Tem.
- Então eu vou querer essa mesmo. Pode ser uma Coca Zero. Não
tem problema.
- Tá. Eu vou lá buscar.
- Ok.
Passam-se os minutos e a campainha toca de novo. Eu vou
atender.
- Eu trouxe seu guaraná!
- Oi?
- Mas não tinha zero! Só normal!
- Oi?
- O guaraná era com bastante azeitona, né?
Essa é minha rotina. São Paulo tem a melhor pizza do
planeta, mas acho que ela seria ainda mais gostosa se eu conseguisse me
comunicar melhor com a pizzaria aqui ao lado.
E, como eu disse lá em cima, não vou falar o nome da
pizzaria. Mas nada me impede de mostrar.
Não é um nome. É uma filosofia. |
7 comentários:
"..., Batman!"
Ou seria Bátima?
Pelo menos elas chegam fumegantes.
Fanta Jaboticaba! XD
(porque eu não pensei nisso antes mode: ON)
História sensacional!
Nunca tinha comido uma pizza paulista até dezembro passado... e descobri que a pizza de vocês é praticamente uma torta! Agora, diante dessa informação, o que vem a ser uma pizza-torta com o dobro do recheio??? Pizza-pie ao estilo casquinha do Mc Donnalds? (obs: note que eu não falei mal da pizza, ainda tenho sonhos de desejos com ela!)
Qto ao atendimento: vc atrai, Rob, só pode!
Pizzarias... Pedi meia de presunto pra minha mãe. Veio o champignon, o catupiry e não veio presunto! E pra explicar pra moça pelo telefone q meu pedido tava certo, mas faltou o ingrediente principal?
Pois é Rob, entender errado um pedido deve ser, em muitos lugares, um requisito básico para conseguir emprego. Mais engraçado é que está deixando de ser um diferencial, rsrsrsr. Já sofri com isso muitas vezes basta pedir "capricha na cebola".
Guaraná zero com azeitonas.
Deu azia isso aí.
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