7 de julho de 2010

Correntes Filosóficas

Apocalípticos e integrados. Freudianos e junguianos. Ofensivos e retranqueiros. Capitalistas e comunistas. Ateus e crentes. Monarquistas e Presidencialistas. Democratas e republicanos. Carnívoros e Vegetarianos. Mozart e Beethoven. Beatles e Rolling Stones. Coca e Pepsi. Campo e praia. Feijão com arroz e arroz com feijão.

Não existe nenhum assunto em que todo mundo concorde. E esta é justamente uma das maiores riquezas do ser humano. Afinal, é justamente das discordâncias que nascem novas idéias, novas maneiras de ver o mundo. A evolução vem da discórdia. E a tolerância também: num mundo ideal, as pessoas não apenas têm opiniões diferentes, como aprendem a respeitar a forma de pensar dos outros. Porque não existe nenhum assunto que todo mundo concorde. Nunca existiu.

Ok, talvez exista uma exceção aí. Não conheço ninguém que discorde da frase “toda unanimidade é burra”, dita por Nélson Rodrigues.

A frase “toda unanimidade é burra” é unânime.

Aliás, vamos pensar sobre isso: se é unânime concordar que “toda unanimidade é burra”, isso faz da frase em si uma burrice. E, se a frase é burra, ela consequentemente estará errada: logo, nem toda unanimidade é burra. Mas, se nem toda unanimidade é burra, a unanimidade em torno da expressão “toda unanimidade é burra” pode estar correta, o que, por sua vez, daria razão à frase, transformando em burrice qualquer unanimidade – incluindo acreditar nesta frase.

Pronto, realizei o sonho da minha vida: inventar um paradoxo, que doravante será chamado de Paradoxo de Gordon (porque, convenhamos, Paradoxo de Chupa Nélson seria prepotente demais).

Mas o ponto não é este. Meu objetivo aqui é abordar duas das correntes de pensamentos mais fortes da história, e que costumam ser deixadas de lado em análises filosóficas. São duas linhas de raciocínio que acompanham o homem há milênios, e que são injustamente relegadas ao lado B da evolução.

Trata-se da divisão entre o “não era importante” e o “era mentira”.

Independente de qual corrente o filósofo segue, suas opiniões sobre o assunto vem à tona sempre que alguém que esquece o que iria falar para ele.

Acontece com todo mundo. Você precisa conversar sobre determinada coisa com uma pessoa, e, ao encontrá-la, o assunto simplesmente sai correndo do cérebro, desce pelo pescoço e se esconde atrás do fígado, normalmente ficando abaixado ali atrás, e rindo baixinho.

Assim, quando você abre a boca, o assunto não está mais lá. Na recepção do cérebro, onde ele esperava para ser atendido, não tem ninguém, só um sofá vazio e uma televisão passando o programa da Ana Hickmann. A recepcionista, claro, não sabe de nada (“ele estava aqui até agora, juro. Deve ter saído quando fui pegar café”).

E aí você fica com aquela cara de bobo na frente da pessoa, até se dar por vencido e soltar um “eu precisava falar uma coisa com você, mas esqueci...”.
E é aí que os filósofos entram em campo.

Algumas pessoas juram de pés juntos que isso aconteceu porque você ia contar uma mentira. Apesar de não ter nenhum embasamento teórico minimamente sólido para crer nisso (especialmente porque ela não sabe nem qual era o assunto), ela não muda de opinião, considerando aquilo quase como uma guerra santa.

Por outro lado, existe a outra corrente de pensamento: aqueles que, após anos de estudos e experimentos deduziram que uma pessoa só se esquece de um assunto que iria falar com outra quando ele não era importante.

E, claro, eles adaptam todo e qualquer exemplo a isso.

Tomemos como exemplo o sujeito que se esqueceu de contar para a namorada que aquela prima loira do interior – aquela mesma, que anda somente de biquíni e colocou silicone nos seios – vai passar o final de semana na casa dele por causa do vestibular.

Os que defendem a idéia do “esqueceu porque não era importante” dizem que ele não contou nada justamente porque isso jamais abalaria o namoro, tratando-se apenas de providenciar hospedagem a um parente distante. Já os que defendem a idéia do “esqueceu porque era mentira” dizem que o sujeito já estava mal intencionado desde o primeiro momento, e que, na primeira oportunidade, serraria a cama do quarto de hóspedes, para obrigar a prima a dormir no mesmo quarto que ele.

A única coisa em que os cientistas dos dois grupos provavelmente concordariam é que o caso, claro, precisaria ser analisado com mais cuidado, com os dois grupos requisitando algumas fotos da prima – preferencialmente de biquíni – para analisar melhor o caso.

Na minha família, existe uma guerra filosófica. Tenho membros das duas correntes no clã Gordon, e não consigo lidar direito com nenhum dos dois.
Mas, agora, colocando isso no papel, tenho que admitir que um deles parece fazer mais sentido.

Vamos, assim, aos exemplos práticos:

1. Mãe

– Eu tinha que falar uma coisa com você, mas esqueci...

– Ah, então era mentira.

– Como assim?

– Se você esqueceu, é porque era mentira.

– Mãe, você não tem como saber disso. Você não sabe o que era. Nem eu sei.

– Com certeza, era mentira.

– Não era mentira. Quer dizer, acho que não. Eu apenas me esqueci o que era. Daqui a pouco eu me lembro e falo.

– Tudo bem, mas deve ser mentira.

– Ok, mãe, ok.

– Aliás, nem precisa falar depois, quando você lembrar.

– Ok, mãe, ok.

– Porque com certeza devia...

– Devia ser mentira. Eu sei.

– Senão você não teria esquecido.

– Ok, mãe, ok.

– Rob, conte logo o que era.

– Mãe, eu não posso contar. Eu esqueci o que era.

– O que você está aprontando, hein?

2. Avó

– Eu tinha que falar uma coisa com você, mas esqueci...

– Então não era importante.

– Como você sabe? Talvez fosse, e eu esqueci porque estou com muita coisa na cabeça.

– Se fosse realmente importante, você não teria esquecido. Você teria esquecido outra coisa, e não essa.

– Tem razão.

É. Ponto para minha avó. Parece ser incontestável. Não chega a ser unânime (Paradoxo de Gordon mode: on), mas parece ser incontestável.

23 comentários:

Flávia Higashi disse...

Eu simplesmente odeio que as pessoas falem isso pra mim!
Porque eu tenho um problema de memória muito sério, hahaha, e eu sempre esqueço de tudo, principalmente o que eu ia falar. Meus amigos tão acostumados já.
E inclusive, muitas vezes é importante. Então discordo de ambas correntes.

;D

Pedro Lucas Rocha Cabral de Vasconcellos disse...

Ambas as corrente me deixam furioso... E se o que eu esqueci fosse a coisa mais importante da terra?

http://lazypedroblog.blogspot.com/2010/04/meaning-of-life.html

Uma vez fiquei tão puto, que escrevi esse texto aí de cima (a coisa que eu esqueci era importante, não era mentira, e alguém se deu muito mal porque eu esqueci...).

Otavio Oliveira disse...

paradoxo de gordon, hem?

Bia Nascimento disse...

Eu vivo esquecendo tudo. Principalmente os assuntos que não tem tanta importância. Portanto, tô do lado da sua vó!
O problema é: e quando a gente esquece um assunto que julgamos importante e que não é mentira??

Bejörn disse...

Ou, o que É MUITO PIOR:

Quando a gente esquece de contar aquela MENTIRA,
Que era super IMPORTANTE de ter sido dita na hora certa.

Dani Cavalheiro disse...

Então me diga, Rob: você está esquecendo de postar sua foto porque ela não é importante ou porque era mentira quando você disse que postaria?

;)

Anônimo disse...

Olhe, toda vez que eu minto, eu não esqueço da mentira que irei contar, mas toda vez que eu esqueço do que vou contar, esqueço também se é verdade ou mentira. Aí é que está...
Depois de pedir ajuda aos universitários(gostava do show do milhão) eu cheguei a conclusão de que a segunda teoria é muito mais aceitável que a primeira, afinal se você fosse mentir, o assunto seria importante o suficiente para ser mudado por sua mente perspicaz.
E também é claro que se não é tão importante assim nós iremos dar prioridade a outros assuntos.

Obs: convenhamos que ser chamado de mentiroso "injustamente" não é vontade de ninguém. Está aí mais um motivo pra confiar na segunda teoria.

Otimo post

Fábio Megale disse...

Não é que "não era importante" é mais incontestável que "era mentira". Sua avó apenas soube escolher os melhores argumentos. Ponto pra ela, de toda maneira. E com louvor.

Mas, na verdade, eu iria fazer um comentário engraçado sobre o assunto, só que esqueci. #piadapronta #piadaruim

Climão Tahiti disse...

Nessas horas tento desenhar.

O problema é esquecer a palavra, daí improviso insistindo.

"É aquele troço que faz cursa de metal que coloca na boca daquele bicho."

"Piercing?"

"Não... É outro... Parecido..."

"Anzol?"

"Isso! É... Como é mesmo o nome?"

Marina disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Marina disse...

Concordo em parte com o "não era importante". Não é que não fosse realmente importante, mas seria menos importante em comparação às outras coisas que você tinha na cabeça.

Varotto disse...

Ia fazer um comentário mas me esqueci...

(piada óbvia mode: ON)

Alexandre Greghi disse...

Tenho que concordar com a sua avó.
Nunca ouvi falar que Aclimação seja mentira. Alias, não é, pq ja passei por lá.
Já, pensar que aclimação não seja importante.... faz muito mais sentido.
Nunca conheci ninguém que more lá, e "Largo da pólvora" é muito mais interessante.

Bel Lucyk disse...

Esquecer o que eu tinha pra falar acontece sempre comigo. E nao adianta... isso faz parte de mim. Daí lembro algumas horas depois. O foda é que muitas vezes o timming já se foi há muito tempo...

Redd disse...

meu cérebro deu erro, tipo esses do windows, qdo li o paradoxo de gordon... mas depois ele voltou a funcionar e eu achei doido!

eu ODEEEEEEEEEEEEIO qdo dizem que o que eu esqueci era mentira! dá vontade de chutar quem fala! (menos a minha mae)

Garbo disse...

Caralho Rob sua vó é uma tipica "vo sábia"! pq tem varios tipos de vó, tem a "vó maluca" (que é o q tenho) q so fala e faz maluquice pq sabe q pde culpar o alemao, tem a "vó rango" que é daquelas q sempre toa te empurrando um paozinho ou um bife de panela, e a vó sabia q éa tua q sempre sai com as sacadas mais brilhantes!

Cláudia Strm disse...

Eu nunca ouvi alguém falar que "esqueceu pq era mentira". Nunca mesmo. Essa é nova pra mim...

Mas o "não é importante" eu ouço (e falo) direto. E super concordo com a sua avó: coisa importante a gente não esquece assim =P

Caio Ranieri disse...

O Paradoxo de Gordon não chaga a ser um paradoxo de verdade. A frase "toda unanimidade é burra" (eu mesmo discordo) não é unânime, e isso destrói todo o paradoxo.

Pedro Lucas Rocha Cabral de Vasconcellos disse...

A não ser que você Seven esteja discordando só para estragar o paradoxo, nesse caso ele se mantém, e você vira um chato de galochas (sempre quis escrever isso hahaha)

Gilmar Gomes disse...

Eu não li o post (aliás estou devras inadiplente quanto a seus posts por falt de tempo e por causa da velha insonia que arrebenta com meu pouco tempo me fazendo não aguentar ler mais q duas linhas sem desabar), mas tenho uma dúvida... Quanto o IG te pagou pra colocar a Besta-Fera como garoto-propaganda da promoção deles da Copa do mundo???

Thiago Dalleck disse...

Além de quererem ser formadoras de opinião, as pessoas ainda querem decidir o que é importante e o que é mentira, haha.

Ana Luísa disse...

Eii
=]
Realmente vc criou um paradoxo, hahaha.
E eu detesto quando tento lembrar de algo e ficam me falando que era mentira ou que não era importante. Não sei qual é a lógica que está por trás dessas 2 ideias.
o.O
Bjoss

ASP disse...

De qualquer forma se alguém se prontificou a falar alguma coisa, ela já estava determinada antes da fala, então jamais poderemos dizer que será uma mentira ou algo não importante, estaremos desconsiderando o lapso, a falha de memória associativa que é tão natural dependendo da idade ou da condição intelectual de cada um