4 de novembro de 2009

Marcha para Vitória - Parte IV

(leia a parte III aqui)

Da rodoviária, fomos para a casa da amiga-noiva. Quer dizer, eles me levaram até lá, já que eu mal conseguia andar.

Tomamos café, colocamos o papo em dia, e por volta de umas 9:00, partimos em direção ao hotel onde eu me hospedaria. Fiz o check in e ganhei minha chave: quarto 1004.

Subi pelo elevador com o amigo-noivo, descemos no décimo andar e eu abri a porta. Tudo o que eu queria era jogar a mala longe, tirar o tênis, devorar as castanhas do frigobar com uma lata de Coca Zero, deitar em algum canto e hibernar até a hora do almoço.

– E aí, Rogério?

Foi o que alguém com voz de sono disse, de algum lugar que eu não consegui identificar, assim que entramos no quarto.

Olhei ao redor.

Nada.

Tive certeza de que o som vinha da sacada.

Olhei para o meu amigo, pronto para dizer a ele "dá para ouvir o que as pessoas falam na varanda do apartamento ao lado". No mesmo instante, os 20% do meu cérebro que eu não controlo se empolgaram e começaram a cochichar entre si, falando alguma coisa como "oba, se tivermos sorte, alguém vai perpetuar a espécie nessa varanda de madrugada, e a gente vai ouvir tudo".

Na verdade, o termo exato que eles usaram não foi "perpetuar a espécie”, mas, como esse blog ainda é de família, vou manter o nível aqui. Mesmo porque o termo que eles usaram não faz diferença, já que nem eu, nem eles, tivemos tempo de dizer algo.

Quem falou, na verdade, foi o amigo-noivo:

– Beacho, tem alguém aqui no apartamento.

– Como assim, tem alguém aqui? O apartamento é meu. Eu não estou pagando apenas pela cama, pelo chuveiro e pelas castanhas do frigobar. Eu estou pagando por exclusividade. Isso aqui não é uma república, é um quarto individual. Eu sou pobre, mas ainda consigo um quarto individual. É evidente que não tem ninguém aqui.

Como resposta, o amigo-noivo apenas apontou na direção do quarto:

– Olhe ali.

Eu obedeci e olhei.

Na cama – que não era uma cama qualquer, era a cama onde eu iria dormir, era a cama com a qual eu estava sonhando há pelo menos doze horas – havia um ser vivo. Olhando mais precisamente, vi que se tratava de um bípede. Aparentemente, um humano.

Era um sujeito magro, que estava colocando a cara para fora dos lençóis, com expressão de "quem são vocês?". Acho que ele estava sem camisa e tinha uma barba rala, mas não lembro ao certo.

Foi uma das poucas vezes na vida em que eu não sabia o que fazer. Olhei para o amigo-noivo em busca de socorro e ele, de bate-pronto, soltou um "vamos embora".

Eu suspirei, pensando que "não adianta, é sempre comigo mesmo".

Foi neste momento que eu percebi, aliás, que nada indica que um dia isso deixará de acontecer.

Sempre será comigo.

Peguei minha mala e saímos para o corredor, deixando meu quarto nas mãos daquele vagabundo magrelo, que, provavelmente, havia ido dormir bêbado, pelado e já havia devorado todas as castanhas do meu frigobar, deixando apenas a merda do chocolate com passas (aliás, porque insistem nessa idéia de chocolate com passas?).

Descemos de volta para a recepção. Chamei a atendente.

– Oi. Não tem um modo fácil de dizer isso, então vamos direto ao ponto. Tem um homem, ou algo que lembra vagamente um homem, no meu quarto.

– Como assim?

– É isso mesmo. Tem um homem no meu quarto. Na cama. Na minha cama.

Ela olhou no computador e devolveu:

– Aqui diz que seu quarto está vazio. Só tem o senhor registrado ali.

– Eu vi um homem ali. Você precisa acreditar em mim, eu não estou louco. Minha noite não foi das mais fáceis, mas eu ainda estou em posse das minhas faculdades mentais. Ao menos, de quase todas elas. Meu amigo viu também.

– Não é possível.

– Me diga uma coisa, algum hóspede morreu naquele quarto? Naquela cama? Porque eu vi uma pessoa ali.

– Não há ninguém no seu quarto.

– Não apenas há, como ele acha que eu sou um tal de Rogério. Será que o Rogério tem algo a ver com a sua morte?

Ela olhou novamente no computador.

– Realmente, não há ninguém hospedado no quarto 1004, a não ser o senhor.

– Se ele for um fantasma, ele não está hospedado, ele mora ali.

– Eu vou pedir para alguém checar, senhor.

– Vamos fazer assim: enquanto você exorciza minha suíte, eu vou tomar um café na padaria.

– Sim, senhor.

– E eu não vou pagar o que ele consumiu no frigobar, viu? Isso fica entre você e a alma penada lá em cima. E se vocês tiverem que usar água benta para tirar ele dali, eu não vou pagar também, é por conta do hotel.

– Sim, senhor.

Voltamos meia hora depois.

Aparentemente, a água benta não deu resultados, porque resolveram me hospedar, desta vez, no 1304.

Peguei minhas coisas e entrei no novo quarto. Mas agora eu estava esperto, não iria passar por tudo aquilo de novo. Meti o pé na porta e entrei no quarto, fazendo o sinal da cruz e rezando:

– The power of Christ compels you! The power of Christ compels you!

Nada.

Ou, ao menos, nada que quisesse ser visível naquele momento.

Eu sempre havia me perguntado porque todo hotel tem uma Bíblia ao lado da cama. Eu dormi agarrado a minhas todas as noites. E, em todas elas, eu tinha medo acordar de madrugada e dar de cara com o Espírito do quarto 1004 andando de cuecas pelo meu apartamento, coçando a bunda e perguntando se a cerveja acabou ou se sobrou castanha. Com certeza, é primo do Jonas.

Então, deixo a dica: se algum leitor se hospedar no Bristol, em Vitória, evitem o quarto 1004. A qualquer custo.

(Sim, continua.)

(Nota: antes de ir embora, descobri a origem do Espírito do 1004. Tratava-se de um sujeito que havia sido transferido de outro quarto para aquele, só que haviam esquecido de registrar isso no sistema. Evidente que, entre todos os clientes, iriam hospedar a MIM neste quarto. Ou seja, não existem fantasmas. Existe apenas o "ô fase".)

27 comentários:

May. disse...

Sério, as pessoas sempre dizem "isso só acontece comigo", "eu tenho um puta azar"... Mas geralmente, é puro exagero. Não no seu caso.
Mesmo.

Marina disse...

Visualizando o fantasma coçando a bunda e perguntando se ainda tinha cerveja. E pensando se eu ia ter medo ou morrer de rir.

Hhaahuahuauahuah! Estou com medo do dia em que você resolva dar uma passada em Recife. Medo de que o mundo se abra no meio da avenida principal e deixe o trânsito pior do que já é.

Pri disse...

Ah! quase a primeira... :(
Cara essa história do hotel me lembrou daquele filme "1408" (acho q é isso), será q vc ainda não está no quarto ainda e pensando q está escrevendo de seu computador numa boa?! Será q é por causas do quarto q sua vida é cheia de infortúnios??
rsrsrsrs
MACABRO!

Hally disse...

Cara... se o nº do quarto fosse 1408, eu teria certeza de que tudo o que acontece na sua vida está ligado diretamente ao John Cusack... =P

Nossa, essa é, com certeza, a melhor saga da história do Champ. Acho até que ele mesmo está adorando tanto infortúnio de uma vez só.

E, depois dessa, os leitores não verão sagas com apenas três partes com bons olhos... prepara o word aí e mão à obra, tu nos deixa mais exigentes a cada dia!

Jullia A. disse...

ok, percebe que sem o seu ps o sentido de pânico teria se espalhado pelos leitores de blog, e eu estaria esperando o fantasma de cueca coçador(?) de bunda.
seria uma honra, dividir um fantasma com rob gordon, mas aparentemente fica pra próxima.

Otavio Cohen disse...

hoaohaoha se eu tivesse sido mais rapido, teria sido o primeiro a falar que era o 1408. e tb o primeiro a falar sobre o John Cusack.enfim...

Otavio Cohen disse...

conselho: da proxima vez, foco nos filmes BONS dele...

Renata Schmitd disse...

Estamos aqui ansiosos para ler o final da saga e ver se ele está contando direito. Acreditem, o tal do rogério estava la mesmo. O que o Rob não falou é que ele achou que o hotel tivesse um serviço para minimizar carência, que coloca um cara para dormir abraçadinho com vc. hehe

Amigos-Noivos - da lua de mel, com sol

Paamps disse...

Meu Deus!
Zica é pouco.

Quando nada parece que vai se tornar pior, pelo menos pra vc Rob, TORNA-SE com louvor ^^

:)

V disse...

UHAUHAHUAUHAHUUHAA
Rindo alto aqui, com a saga inteira. Melhor post do champ de todos os tempos!

Pedro Lucas Rocha Cabral de Vasconcellos disse...

Rob gordon, fazendo os outros rirem de sua infelicidade desde 1969

Garota Marota disse...

Ai, Rob...
Me divirto.
Adorei o "peguei a passagem e saí correndo, já com meia bunda de fora." do post anterior! rs
Sabe, eu sou carioca mas moro aqui no ES. Mais precisamente em Vila Velha!!! Tentei sábado ir ao Rio visitar minha família e de nenhuma das maneiras possíveis de se viajar, eu consegui!
Vôo cancelado, ônibus perdido na rodoviária, carro inguiçado...
Entendo bem seu drama! rs
Pra mim, até hoje, essa está sendo a melhor saga!
Beijokas

Leandro disse...

1 - pelo menos nesse episo'dio as calças pararam de cair;
2 - o que tem de errado contigo que ninguém acredita nas coisas que você fala (principalmente quando se trata de uma reclamação)?

Abraços

Climão Tahiti disse...

Vc precisa de um exorcista.

Sério.

Gilmar Gomes disse...

sei que isso não conta para atingir os 30 comentários, mas ó... comentei!!

realmente fica dificil aguardar...

Penelophy disse...

Fala a verdade.

vc escreve esses textos engraçados só pra nos fazer chorar de rir escondido no trabalho?

Só pode.

Anônimo disse...

Pessoal

O negócio dos 30 comentários não é uma regra, não se prendam a isso. Como eu disse, isso é apenas para me guiar: como esta é a média de comentários, isso mostra para mim que a maioria dos leitores já leu o texto e que é a hora de atualizar.

Rob

Davis Sousa disse...

Não é a tôa que o nome do estado é Espírito Santo. :P

Varotto disse...

Chega!

Estou mandando agora para você um kit auto-exorcizeitor e anti-macumbeitor (e, se você responder nos próximos dez minutos, inteiramente de graça, um urucubaca elimineitor).

Anônimo disse...

Varotto

Se puder acrescentar um limpador de zica 2.0, eu fecho o pacote. Manda pro Degas, eu pego lá.

Rob

Matheus Carvalho de Lima disse...

hahahahahahahhaha


essa epopéia ta se tornando a melhor saga do blog inteiro... com certeza... hahahahahahahahaha

cara... vc só se fode, puta merda... quando vier a bh, vai haver um engavetamento na afonso pena... da rodoviária a praça da bandeira... hahahahahahahahahaha e quando vc estiver atrasado pra alguma coisa importante ainda... ahahahahaha

essa ta sendo a melhor saga do blog com certeza... e posta logo essa parte V, seu animal...

Kel Sodré disse...

huahuahua

Dia desses vou com a Lívia (nova leitora do Champ introduzida por mim :-D) tomar um passe num centro espírita pra dar uma catalizada nas boas energias. Topa?

Renan Becker disse...

Não é a tôa que o nome do estado é Espírito Santo. :P [2] eu ri! ahushauhs esses espiritos que nos cercam! isso é fora do normal mesmo, mas só acontece com a gente hauhsuahs

Junior disse...

Caraca, Rob! Que azar, hahaha! Estou acompanhando essa saga, já ancioso pelo proximo post.
As vezes tu se fode tanto no mesmo post que parece até impossível acontecer isso com a mesma pessoa... e em um só post!

Layla Barlavento disse...

E eu, a ingenuidade em pessoa, achando que iríamos pular o hotel e ir logo para os finalmente do casório... Claro que precisava acontecer alguma coisa no hotel! E Rob, a frase: "Tinha que ser comigo" foi criada pra você. Quem a utiliza sem sua autorização devia ser processado!

Abraços!

Lang "The peacefull" disse...

Mae do ceu eu ri muito! XD

Dee disse...

Tem MESMO certeza que não era um primo perdido do Jonas? :P


E é igual naquele filme que eu não lembro o nome: levam o cara pra uma sala onde tem uma mesa com trocentas cadeiras e apenas uma delas está quebrada.
Qual ele escolhe: ;-)