(leia a parte I aqui)
Mas a minha decisão de não usar mais o banheiro implicaria num rompimento doloroso.
Abri a geladeira e olhei a peça de fraldinha que esperava ansiosamente para ser assada algumas horas depois. Peguei um banquinho, me sentei na frente da geladeira aberta e comecei a conversar com ela. Tentei explicar que nosso relacionamento não teria futuro, que havíamos nos conhecido num momento errado da minha vida. Usei até o clichê “o problema não é você, sou eu” (o que não deixava de ser verdade, já que eu era o dono do banheiro, não ela).
Assim como toda separação, foi dolorido para nós dois. Mas ela entendeu.
Voltei para a sala e me sentei no sofá, me preparando para me alimentar somente de oxigênio durante as próximas horas. Lembrei-me do Batman dizendo que “a fome alimenta o espírito”, mas logo em seguida imaginei o número de banheiros que ele deve ter na Batcaverna e achei hipocrisia demais da parte dele.
Meu organismo, por outro lado, sabendo da minha impossibilidade de usar o banheiro, resolveu contra-atacar, mostrando que quem manda aqui não é o cérebro, mas sim os intestinos. Comecei a ouvir barulhos semelhantes a trovões dentro de mim, anunciando que logo o tempo ficaria feio lá dentro. Malditos Delgado e Grosso.
Olhei para o relógio. Das doze horas, haviam se passado... Quarenta minutos.
Respirei fundo e decidi que o melhor a fazer era me distrair.
Peguei O Poderoso Chefão, deitei no sofá e continuei a ler. Fui atravessando as páginas, mas aquele bando de mafiosos discutindo assassinatos enquanto comiam fetuccines e vitelas começou a me fazer mal. Muito mal. Delgado e Grosso não estavam apenas tentando fazer chover dentro de mim, como estavam tentando arrombar a porta do meu estômago com uma marreta.
Mas aí cheguei no trecho em que o Michael vai jantar com Sollozzo. Eu conheço a história de cor, então sabia o que me esperava algumas páginas adiante. Em poucos minutos, Michael se levanta, vai até o banheiro e encontra uma arma colocada atrás de onde? Da descarga.
Comecei a me contorcer de cólicas no sofá.
Joguei o livro longe e comecei a reconsiderar tudo. A Fnac não era mais opção. Não daria tempo.
Mas o meu banheiro também não era uma opção.
Aposto que na Pré-História, um neanderthal que não conseguisse sair da caverna para usar o matinho seria expulso da tribo, por emporcalhar o lugar em que vivia. Era expulso e humilhado, com direito a ter que abandonar a tribo (enquanto os outros primatas o xingavam de “porco, sujo e nojento!” e jogavam cascas de frutas nele) para viver como um paria, sozinho, no meio da floresta. Ele se tornaria um aleijado social, um excluído.
E eu corria o mesmo risco, já que, obviamente, minha síndica deve ser adepta da mesma filosofia. Se eu usasse o banheiro aqui em casa, logo seria identificado por ela. Seria amarrado e levado para um julgamento no salão de festas do prédio, chamado de porco, sujo e nojento e expulso do prédio. Quase pude ouvir ela falando “não vou jogar você aos porcos porque você é sujo demais para eles”.
Eu seria expulso do prédio – e, minha síndica ainda me obrigaria a pagar o conserto da descarga, mostrando que a única evolução que ela desenvolveu dos primatas foi a financeira.
Comecei a suar. Uma sirene de alerta vermelho começou a tocar no meu corpo, e todos os órgãos do meu aparelho digestivo correram para os postos de combate.
Delgado e Grosso haviam conseguido abrir um buraco na parede do meu estômago e estavam enfiando dinamite lá dentro. Murmurei algo como “se eu comer umas duas maçãs agora à noite, vocês me deixam em paz?” Eles riram.
Bom, mas eu ainda fazia parte da civilização. Eu ainda não havia sido expulso de lugar algum. Assim, resolvi aproveitar as vantagens do mundo moderno para encontrar uma saída. Corri para a frente do computador e acessei o Google. Mas antes que eu pudesse digitar “+ descarga não funciona + intestinos funcionam + socorro!!!!” meu Messenger apitou. Era o Tyler.
Expliquei a situação para ele da melhor forma que podia – suando frio, tremendo – e ele deu um conselho: “jogue baldes de água lá dentro, costuma funcionar”. Tive tempo apenas de digitar “Tyler Bazz, the Sanitary Master!” e corri para o banheiro, abrindo as calças.
Obviamente, não vou entrar em detalhes aqui. Basta vocês imaginarem o bairro de Pinheiros visto de cima e a Ode a Alegria, da 9ª de Beethoven, ecoando por toda a zona Oeste de São Paulo.
Mais recuperado, abotoei a calça e fui para a lavanderia. Enchi um balde de água e atravessei a sala com ele, em direção ao banheiro, e sob os olhares de desprezo da Besta-Fera. Entrei no banheiro, respirei fundo e virei o conteúdo do balde dentro do vaso.
Eu estava de volta à civilização!
Tudo bem, eu ainda não estava de volta ao século 21, pois, cá entre nós, depender de baldes para esse tipo de situação é digno dos pioneiros de filmes do John Wayne, mas o século 17 já era um lugar muito mais confortável que a Pré-História.
Fora que a técnica do balde me daria tempo para agüentar até o técnico checar no dia seguinte, e me colocar novamente no ano 2000. Aliás, como os comentários do post anterior deixaram claro, eu era a única pessoa no planeta que não conhecia a técnica do balde. Shame on you, Rob Gordon, shame on you.
Aliviado, abri a geladeira e expliquei para a fraldinha que havia me precipitado, eu estava apenas com medo de me envolver demais, mas gostaria de tentar. Convidei-a para jantar comigo naquela mesma noite, e ela aceitou.
Fechei a geladeira e, como um adolescente que consegue seu primeiro encontro, dei um pulo de felicidade. Fui tomar banho, passar perfume e me arrumar. Mas, prevendo uma noite inesquecível, já deixei dois baldes de água prontos na lavanderia.
Afinal, não sei se o seguro realmente morreu de velho. Mas, com certeza, ele viveu num lugar limpo e respirável.
18 comentários:
Como eu disse antes, não sei como você sobreviveu até hoje sem saber disso. Sério, as privadas daí não entopem?
Depois que li o post anterior eu pensei: "Por que será que ele nãõ jogou um balde d'água?"
Acho que só você, Rob, não conhecia a velha técnica do balde. Aí em Pinheiros nao falta água nunca?
Então, eu não conhecia isso. Ou conhecia e não lembrava, não sei.
Mas sempre que entupiu aqui em casa, íamos no desentupidor mesmo, nada de balde.
Como tudo acontece com você, não me surpreendi quando percebi que você não sabia a técnica do balde. Anota aí viu?
Abraços
Layla Barlavento
http://culpadowalter.blogspot.com
Vamos por partes:
1º -
Depois que li o post anterior eu pensei: "Por que será que ele nãõ jogou um balde d'água?" [2] - Aqui na minha cidade, o saneamento básico foi bem tardio. Fazíamos isso até pouco, muito pouco tempo atrás. Loosho e elegancia, teu nome é "cidade natal da BRID".
2º - Não acrdito que a fraldinha acreditou nesta sua desculpa esfarrapada. É por isso que as carnes estão cada vez menos valorizadas e mais marginalizadas no mercado. Elas proprias não se valorizam. Fraldinha, teu nome é fraqueza!
3º - Após jogar o balde com água, é sempre de bom tom, borrifar Bom Ar e jogar um pouco de desinfetante com amoníaco (vc ja trabalhou em lojas de produtos de limpeza, deve conhecer o famoso AJAX). Palavra de quem mora num lugar longínquo e sem dono. Ficadica!
4º - A distância da queda da água do balde até a privada vai nivelar a pressão da "descarga" que vc vai aplicar. Ou seja: Qto maior a quantidade de escrementos fecais, resíduos, peixinhos dourados, ou o que seja, maior a distância da queda d'agua. Ou seja, se por acaso a quantidade de (coloque aqui o que vc quiser) dentro do vaso for grande demais, vale pegar um banquinho ou coisa parecida pra vc não precisar refazer o procedimento mais vezes.
Dito isto, coloco-me a disposição para quaisquer dúvidas.
Gracta
BRID
PS: Este meu procedimento é válido para privadas que reincidem e não desentopem sozinhas.
PS2: Jogar Coca Cola, Diabo Verde, Ácido, Pepsi Twist, e outros artifícios podem danificar o seu encanamento, ou causar sérios danos a sua saúde, mas resolvem em alguns casos. Ficadica.
PS3: O diretor financeiro aqui da empresa, falou q construir uma vala reserva em algum local escondido perto da sua casa pode ser uma opção. Resolveu com ele, mas ele mora numa cidade ainda menos evoluída que a minha, então isso deve ser super comum por lá. Vai saber!
Sem mais.
BRID
Falando em vala, lembrei do filme "Cova Rasa".
Vai entender.
Realmente, você precisa se casar logo.
Ou vai morrer antes disso. o.o'
Não comentarei as referências à minha vida pessoal no post. aUHAuhaUHAuhaUHAuhaUHAuha
Mas, pra vc ver.. dizem que eu faço drama.. mas quando eu consigo ser MASTER em algo, é em algo que todo mundo sabe. Ô fase.
Muito boa a ideia de deixar baldes já prontos... afinal, as chances de acabar a água SÓ DO SEU apartamento nessa noite eram grandes.
:D
ps: nosssas conversas no msn são clássicos do humor contemporâneo. A gente devia arrumar um jeito de lucrar com isso.
Fiquei besta de saber que tu não conhecia a técnica do balde. Isso é mais velho que andar pra frente!!
Hahahahahaha
Ou São Paulo é um lugar muito evoluído, onde não falta água e privadas não entopem, vai saber!
¬¬'
Alguém já disse isso aí em cima mas eu reforço : você precisa casar logo ou vai se matar qualquer dias desses.
E tenha dó, não conhecer a técnica do balde é o fim Sr. Gordon :DD
Ainda bem que você fez as pazes com a fraldinha. Elas costumam ser muito sensíveis quando rejeitadas, quase sempre fogem e acabam em um daqueles churrasquinhos gregos. Já dizia o velho adágio popular "cagar salva relacionamentos".
abraço!
Pensei se o Tyler fosse o tipo de cara nada camarada, que iria apenas rir da sua cara ao invés de dar o conselho do balde...
Ahahahahahaahahahahaha
ahahahahahahahahahahaahahahahaha
ahahahahahahahaahahahahahahahaha
ahahahahahahahahahahahaahahaahahahahahahahahahahaha
ahahahahahahahahahahahahah!
SENSACIONAL!
Como é que uma pessoa pode ignorar uma técnica tão avançada como a do balde de água? Shame on you, meeeesmo!
Rssssss!
Bjs!
HAHAHAHA!
Fantástico!!!
Curti muito a sua maneira criativa e hilário de nos contar um fato tão simples.
Tyler Bazz salvando as pessoas em desespero da janelinha de um msn mais uma vez... quantas vezes não fui salva por esse rapaz tão pronto a oferecer ajuda a cabeças que não funcionam.
e quanto ao comentário dele ali em cima... eu compraria um livro com as histórias dos diálogos entre Rob Gordon e Tyler Bazz... sem nenhuma dor no bolso..
Por que não encheste os baldes no chuveiro? Não facilita pros diabinhos!
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