Eu nunca havia ido a uma Virada Cultural e nem tinha planos de ir a alguma delas.
Primeiro: não tenho mais idade para virar a noite andando pelo centro de São Paulo lotado ao som de cantores que eu não gosto. Segundo, não gosto de nenhum evento gratuito.
Sim, sou totalmente a favor da realização de eventos culturais para a população, mas também sou totalmente a favor do meu direito de ficar em casa enquanto eles acontecem. Afinal, enquanto num evento pago você tem certeza de que (teoricamente) todas as pessoas presentes querem assistir ao artista, num show gratuito metade da lotação seja de perdidos e curiosos que estão ali apenas para a) ver do que se trata, b) cantar todas as mulheres possíveis, c) fazer graça e querer aparecer, e d) fazer graça e querer aparecer ainda mais que as pessoas que escolheram a alternativa “c’.
Ou seja, a meu ver, a Virada Cultural sempre foi algo que, ao invés de fazer você se divertir, faz com que você se irrite e perca uma noite de sono. E se você tem mais de 30 anos de idade, sabe o quanto é difícil repor uma noite de sono perdida.
Justamente por isso que, nas edições anteriores do evento, eu não me interessei nem em olhar a programação, pois sabia que se alguma coisa me interessasse realmente, eu ficaria sabendo de qualquer jeito. E isso aconteceu este ano, quando descobri que haveria uma mostra de filmes de mortos-vivos num cinema da República, incluindo os três filmes da trilogia original do George Romero (a saber: A Noite dos Mortos Vivos, Despertar dos Mortos, Dia dos Mortos).
Imediatamente, acionei e consultei as únicas duas pessoas que conheço que gostam disso tanto quanto eu: meu irmão e um amigo de faculdade. Após rápida conferência (na qual todos os muitos pontos negativos eram compensados com o argumento “porra, são os filmes do Romero!”) decidimos ir.
Resultado: nos encontramos as 11 horas da noite, prontos para ficar entre as 2 e as 8 da manhã assistindo pessoas incautas serem devoradas por zumbis.
E, obviamente, fomos rezando para as sessões serem pagas.
O caminho até o cinema foi mais fácil do que imaginei. As ruas do centro estavam lotadas, mas isso era de esperar, afinal, você tinha um show em cada esquina. O único empecilho foi que precisávamos chegar de um ponto A até um ponto B, mas, se traçássemos uma linha reta entre estes dois pontos, havia uma área Vip no meio do caminho. Sim, uma área Vip. Ou, ao menos, um quarteirão inteiro totalmente vazio, com apenas dois policiais conversando atrás da grade que separava os Vips invisíveis de nós, mortais.
Ou seja, tivemos que fazer o caminho mais longo possível, nos enfiando no meio da multidão.
Na verdade, mais difícil que atravessar as multidões era evitar pisar em uma das milhares de garrafas de vinho barato jogadas pelas ruas. Aliás, me chamou a atenção que a quantidade de garrafas e latas de cerveja indicava que aquele povo havia consumido vinho suficiente para embriagar metade da Itália, mas a coisa mais próxima de um policial que eu vi em todo o percurso era meu irmão (isso porque ele tem cara e jeito de polícia civil, e só).
Ou seja, a probabilidade de dar merda era grande.
Felizmente, ter 1.60m vale mais a pena que ter 1.90m, desde que você saiba usar sua estatura ao seu favor. Eu acionei o hobbit mode: on e passei e abrir caminho no meio da multidão me enfiando em espaços minúsculos e passando por baixo das outras pessoas.
Entretanto, se chegar ao cinema foi mais fácil do que imaginei, o passeio não foi dos mais agradáveis. Especialmente porque durante boa parte do percurso éramos brindados com um aroma forte e ácido, que invadia as narinas provocando náuseas, e que é popularmente conhecido como “cheiro de mijo”. Insuportável. Mesmo. Às vezes nós conseguíamos caminhar alguns metros respirando normalmente, mas, subitamente, o vento mudava de direção (provavelmente porque ele não queria chegar perto do show do Wando) e aquele doce e bucólico perfume de canto de rodoviária voltava a surgir.
Entretanto, depois de cerca de meia hora desviando de bêbados tomando cuidado para não escorregar numa garrafa e com a respiração presa, chegamos ao cinema. Estava passando Planeta Terror. Olhamos no relógio, e ainda faltava pouco mais de uma hora para os filmes do Romero serem exibidos.
Missão cumprida.
Ou não.
(continua...)
23 comentários:
Essa historia de recuperar uma noite de sono ja' esta' virando um desafio pra mim. O pior de tudo é que eu nunca consigo dormir até depois das 8:00 a.m.
Pois é Leandro. Você ainda tem a sorte de conseguir dormir até as 8h. Pra mim o dead line é as 5h. É melhor não reclamar...
E Rob, o certo não é "difícil repor uma noite de sono perdida após os 30", é realmente impossível!
Ter 1,60 tem lá suas vantagens.
;D
Tb odeio esses shows gratuitos. E com apresentaçõezinhas mambembes bizarras.
As pessoas não conseguem somente ver uma apresentação, qualquer que seja. Isso obrigatoriamente tem que incluir litros de bebida barata e mijo espalhado por todos os cantos.
E, ahn, Rob... defina melhor esse 'jeito e cara de polícia civil'. Fiquei deveras curiosa! :P ;)
Lilian
Vou tentar descrever.
Imagine um shopping center em dezembro. Corredores lotados, famílias, namorados, crianças correndo.
Agora, imagine uma pessoa de pouco mais de 1.60 (nanismo é genético, você sabe) andando por estes mesmos corredores despreocupadamente, porque as pessoas abrem caminho para ele.
Eu estava lá no palco "róquenrrou" da República. Cheguei antes de começarem os shows, achei um lugar perto da tenda onde tinha a galerinha VIP e sentei. Não tinha cheiro de banheiro público e ninguém ficou me empurrando. Algumas horinhas depois, fui decidir sair do meu posto porque o sono bateu forte e... Então, não dava. Na parte de trás estava dez mil vezes pior que lá na frente (o que é bem estranho). Depois de dar uma garrafa num idiota que tentou me agarrar, aí ok, ninguém mais mexeu comigo e consegui sair sossegada. Ter um 1,70 também tem suas vantagens.
posso não ter passado dos 30, mas realmente a virada cultural não é mais pra mim. já fui duas vezes - que soaram mais como um programa d índio. agora, com uma filhota nas costas a coisa fica bem mais difícil. e outra: odeio coisas gratuitas, por esses motivos que citou e por alguns outros. zoado. q venha a segunda parte.abraço, rapah!
Eu também uso da técnica hobbit em lugares com multidões,adoro ser baixinha ^_^
Se você com um pouquinho mais de 30 já não aguenta, imagina eu que já passei dos 40, virada para mim, só se for para me ajeitar na cama :DD
Aguardo ansiosa o desfecho da saga ^_^
Beijo
1°- tive que usar isso de nick. Espero que vc não omita esse "pequeno" detalhe da "virada dos mortos", senão eu mesmo crio um blog só pra falar sobre isso.
2°- Ahhhhh Kakah... ja sabemos quem era a dançarina de cima do ônibus na Praça da República.
3°- Matheus... ter 15 anos e parecer normal são duas coisas que cada vez menos andam juntas.
Odeio quando não tenho nada pra comentar no primeiro post da saga. Fico com a impressão de que to perdendo algo... não quero só concordar com as reclamações sobre multidão.
Também pensei em fazer umas piadinhas sobre sua sexualidade, graças ao hobbit mode e toda aquela história do Frodo ser meio bichinha.
Mas não.
Tyler
Não faltará oportunidade, vai por mim. (bosta de virada cultural mode: on)
Tyler, sacanagem você falar assim do Frodo só porque o baixinho passou três filmes tentando desesperadamente queimar o anel.
P.S. : Apesar de estar saindo da caverna depois de um longo e tenebroso inverno longe das hostes CHAMPolínicas, também não tenho nada melhor para comentar agora do que essa piadinha infame.
Obrigada, Rob. Agora até eu fiquei com medo do seu irmão. :P
E, ahn, devo juntar-me ao clube dos baixinhos: 1,59m. E eu não banco o hobbit. Dependendo da multidão, eu abro é na cotovelada mesmo, rs...
"Planeta Terror"
Devo ser um dos poucos que gostaram desse filme (Tarantino mode:on)
Adorei hobbit mode:on companheiro de 1.60
Varotto:
Welcome back.
Lilian:
Se eu, que sou irmão, tenho pavor, seu medo é altamente justificável.
Thiago Apenas:
Eu também adorei - especialmente os "defeitos" na tela (riscos, etc)
bah... acabo de "trabalhar" em um evento gratuito aqui em SC e... também os odeio... primeiro porque o cara não deu um centavo para estar ali vendo o troço, mas se acha no direito de passar por cima de todos ( e em alguns casos, do palco tbm!) para poder ver melhor o negócio....
Haja paciência pra gente bêbada!!!!!
Oi Rob!
Preciso ver esses filmes, rs..
Nem High Fidelity eu vi ainda.
A Lapa aqui no rio é quase uma virada permanente. E o pior são as pessoas dizendo "uau, vc mora na lapa". Sim, moro, e me acabo todo dia. É só dar aquela inspirada profunda que a mistura xixi, alcool e fumaça te levam ás alturas instantaneamente. Maravilhoso, putz..
Esses eventos são sempre assim. é impossível fazer as pessoas entenderem que devem ser educadas em toda parte. Um aborrecimento aqui e ali é inevitável sempre.
Nem tenho mto o q dizer sobre o testo - o q é uma pena, pq faz tempo q não consigo vir aki...
Mas só queria fazer um breve comentário - os eventos gratuitos daqui de Brasília, sempre, sempre dão briga, podendo até dar morte! Essa é a razão pela qual nunca vou em algum deles...
té mais!
INVEJA MODE: ON
Passaria por tudo isso pra ver os filme do Romero, certeza, um dos meus diretores favoritos....
Ps: Blog muito bom, cara. O Tyler me falou dele mó cara, mas só agora decidi comentar.
“Por que você não aproveita a Virada Cultural para virar homem?”
hauhauahuahauahauahu
e de repente, eis que cinco meses depois o professor de Crítica Cinematográfica escreve os nomes de sete diretores no quadro. tínhamos que escolher um pra apresentar um seminário e, obviamente, uma crítica. Entre Coppola (a filha), Lynch e Cronemberg, não tive dúvida em escolher ROMERO. E essa sua saga foi a primeira coisa que eu lembrei ehhehe. (o professor inclusive exlcuiu o Romero da lista e só retornou com ele depois de uma súplica minha)
Minha saga dos mortos começa nesse fim de semana. Foi bom reler sua historia ;)
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