Eu me lembro da primeira lição que aprendi com meu pai.
Estávamos saindo da igreja. Quando eu era criança, meu pai
me levava à igreja todos os domingos. É engraçado que eu não me lembro da missa
em si, apenas de que eu estava carregando o ramo de uma planta, pois era o
domingo antes de Páscoa.
Nessa data, o padre fazia uma espécie de procissão, com todas
as pessoas da missa andando pelas ruas ao redor da igreja, com um ramo da
planta erguido. Nunca vi isso acontecer em outro lugar e tenho certeza de que
deve existir uma explicação para isso, mas sempre me esqueço de procurar.
Mas a bronca que tomei não aconteceu na procissão. Se você
está imaginando que eu fiz algo errado com a planta – eu também imaginaria isso
– se enganou. Foi depois da missa, quando estávamos indo para o carro.
Eu estava ao lado de meu pai. Minha mãe e minha avó seguiam
logo atrás. Consigo até mesmo ver a cena, anos atrás. Em uma mão eu carregava o
ramo da planta e, com a outra segurava a mão de meu pai, provavelmente me
sentindo seguro em ver como a mão dele era maior que a minha. E me lembro de
atravessar a rua apressado com ele – talvez um carro estivesse vindo.
Foi no outro lado na rua que o vi. Era um homem, adulto como
pai, encostado na varanda de sua casa, fumando e olhando alguma coisa nas mãos.
Provavelmente, observando as pessoas irem embora da missa, que me parece algo
que as pessoas fazem numa manhã preguiçosa de domingo. Mas eu não pensei no que
ele estava fazendo. Tudo o que eu consegui pensar foi que ele parecia pelado.
Ele não devia estar pelado. Provavelmente estava usando uma
bermuda, talvez até mesmo uma calça. Mas eu só vi que ele estava sem camisa e
constatei que ele parecia pelado. Assim, eu gritei para ele a mesma coisa que
minha avó gritava para mim quando eu saía pelado do banho.
- Ei, peladão! Por que você está peladão?
Imediatamente, meu pai me deu um safanão e gritou “que falta
de respeito!”, e eu não entendi direito, porque minha avó gritava isso para mim
também. Antes que eu pudesse entender o que havia feito de errado, meu pai
olhou para o homem na casa e pediu desculpas, disse que eu não costumava ser
assim.
Eu não me lembro do rosto do homem, mas outro dia perguntei
isso para meu pai. Ele não se lembrava da história. Mas eu lembro que o homem começou
a gargalhar com meu grito – eu lembro bem do som da risada dele, ele era
daquelas pessoas que riem alto – e deu tchau para mim. Meu pai pediu desculpas
novamente, e o homem, ainda rindo, disse que não tinha problemas.
E acenou para mim, me dando tchau e gritando que “eu prometo
que vou colocar uma roupa”. E ainda ria, fazendo com que eu entendesse menos
ainda porque aquilo havia sido falta de respeito e porque meu pai havia ficado
bravo. E eu tenho certeza que lembro que, quando meu pai viu que o homem estava
gargalhando, começou a rir também, mesmo sem parar de pedir desculpas.
Quando entramos no carro, meu pai me explicou que eu não
podia fazer esse tipo de coisa. Disse que eu precisava respeitar as outras
pessoas na rua, mesmo quando elas pareciam estar fazendo algo diferente ou engraçado.
Disse também que muitas vezes elas não estariam fazendo nada demais, e que nós
acharíamos que estavam apenas porque não as conhecíamos. E no final, ele disse,
com ar sério, que mesmo se elas estivessem fazendo algo diferente, eu precisava
respeitar cada uma delas, exatamente como eu gostaria que elas me respeitassem.
Nunca esqueci isso. Carreguei comigo essa história, como uma
daquelas memórias de infância que escolhem ficar guardadas. Não sei onde foi parar
o ramo da planta, mas o respeito pelos outros, que meu pai me ensinou, continua
comigo. E pretendo ensinar o que aprendi com meu pai aos meus filhos.
E eu nunca descobri que o homem que estava na casa perto da
igreja, aquele que eu achei que estava peladão e que gargalhou com meu grito, voltou
para dentro de casa e escreveu, em seu blog, sobre a primeira lição que aprendi
com meu pai, neste texto que você acabou de ler.
Você encontrou com você mesmo no passado, e não deu nenhum recado pra ele sobre o futuro? Assim você me decepciona!
ResponderExcluir