21 de dezembro de 2017

12:12

Eu ainda nem tinha tomado café quando tivemos que correr para o hospital e isso depois de já passarmos a noite no pronto socorro quando a gente descobriu que era alarme falso mas dessa vez tudo ia acontecer de verdade porque a bolsa tinha estourado e entramos no hospital com ela tentando contar as contrações eu falando para a médica que esquecemos o ultrassom por causa da correria e a médica respondeu que trazer o ultrassom sempre é importante e eu mandei ela esquecer a merda do ultrassom e examinar a minha esposa e ela começou a fazer uns exames e eu corri para a administração para ver os documentos da internação e de lá corri para o segundo andar junto com uma enfermeira para deixar as malas no quarto e fui de volta para o primeiro andar onde me deram uma roupa verde igual a dos médicos e mandaram eu colocar por cima da roupa que eu estava usando e a calça não entrava porque eu tinha dois celulares e duas carteiras comigo e eu comecei a pular por aquela sala que parecia um vestiário desesperado tentando enfiar a calça por cima da bermuda jeans e tive uma crise de ódio e gritei um palavrão porque minha carteira não deixava a calça entrar e voltei correndo para fora para pedir uma calça maior e essa finalmente entrou e eu atravessei os corredores o mais rápido que pude enquanto colocava uma touca na cabeça perguntando para todo mundo onde ela está e quando finalmente entrei na sala mandaram eu colocar uma máscara e eu não conseguia amarrar aquilo de jeito nenhum na cabeça porque minhas mãos tremiam mas consegui dar um jeito provavelmente amarrando errado mas não me importei muito porque minha esposa estava gritando e a médica falou algo atravessado e eu pensei que vou ter que segurar minha esposa antes que ela dê um tapa na cara dessa médica e os gritos aumentaram e todo mundo falando que ela estava indo bem que estava quase nascendo e continue fazendo força e eu fiquei ali me sentindo um pouco inútil porque eu queria fazer força junto com ela mas não podia e o pouco que eu podia fazer era conversar com ela e dizer que amo muito ela e que tudo vai dar certo e todas aquelas frases que a gente sabe que ela nem está ouvindo mas que você diz mesmo assim e lembro de ter limpado uma lágrima do rosto da minha esposa e de repente a médica e todas as enfermeiras começaram a falar ao mesmo tempo e eu não sabia em qual delas eu prestava atenção e mesmo se soubesse não ia conseguir prestar atenção em nada que não fosse minha esposa mas de repente a médica falou que essa vai ser a última contração e eu me lembro de pensar que se podemos esperar só mais uns dois minutos porque eu não sei se ainda já estou pronto para isso mas antes que eu pudesse fazer qualquer coisa alguém que estava na sala começou a gritar que está vindo está vindo está vindo só mais um pouco

E, exatamente às 12:12, minha vida ganhou pontuação.

Ele olhou na minha direção. Seus olhos eram escuros e pequenos mas pareciam maiores que o mundo. E quando ele começou a chorar, eu chorei junto. Éramos duas crianças. Ele chorava porque havia acabado de nascer. Eu soluçava porque havia acabado de nascer de novo.

Enquanto nós dois chorávamos juntos, meu passado ganhou um novo significado. Memórias de mais de quatro décadas começaram a se movimentar dentro de mim. Meus sorrisos de criança se uniram com tudo o que aprontei na adolescência e com cada coisa que aprendi depois de adulto. Todas as minhas lembranças começaram a se comportar como peças de um quebra-cabeça que decidiram, por conta própria, se juntar e revelar o segredo que escondiam.

E a imagem que o quebra-cabeça formou era o rosto dele.

Foi então que entendi que tudo o que vivi nesses mais de quarenta anos não eram fatos isolados, e sim capítulos de uma história maior. Cada lembrança doce, cada lição aprendida, cada pequena conquista... Tudo havia me levado até ali. Cada instante da minha história havia me conduzido até aquele momento. Em direção àquele menininho.

No meio da correria das pessoas de verde, do falatório apressado, do choro do meu filho e da enormidade do futuro que se abria na minha frente, com todos os sonhos e medos e receios e desejos e cuidados e erros e aprendizados... Eu respirei fundo e pensei no meu pai. Fechei os olhos e enxerguei exatamente o que o meu pai significa para mim.

E tudo ficou mais claro. Dali em diante, cada passo que eu der precisa garantir que ele seja uma pessoa feliz. Cada escolha que eu fizer precisa transformar esse menininho em um homem melhor que eu. Agora, tudo o que eu sou, tudo o que fui e tudo o que eu possa ser um dia, é dele.

Foi neste momento que me tornei pai. E foi neste momento que eu percebi que havia passado a vida inteira querendo ser o pai do Felipe.

Eram 12:12 quando tudo fez sentido.

Abri os olhos e vi que alguém havia colocado meu filho sobre minha esposa. Ele estava deitado e assustado como um enfeite de cristal que, depois de ser desembrulhado e colocado em uma estante, olha ao redor para compreender aquele novo mundo. Mas ele não era feito de cristal. Ele era feito de de tudo o que eu sou. Ele era feito de amor.

Pela primeira vez na vida, me aproximei do rosto dele e, pensando no meu pai e pensando no meu filho, eu disse baixinho:

“Eu sou seu pai. E meu amor por você é maior que a vida”.


Eram 12:13 e eu ainda estava chorando.

Eram 12:12 quando eu comecei a
escrever o maior texto da minha vida.

19 comentários:

Bruno Quinta disse...

Parabéns Rob Gordon!
Esse foi um de seus textos mais sensacionais que eu já tive a oportunidade de ler.

Unknown disse...

Felipe Savini Gordon. Taí, gostei.

Jackson S deJesus disse...

Lindo e profundo!

Adônis DT disse...

Estava tão envolvido que nem reparei na falta de pontuação. Lindo texto. Parabéns, Rob! :')

Alexandre Rigotti disse...

E eu ganhei um sobrinho. Tive que segurar a ansiedade do seu pai e a felicidade incontida da sua mãe.

Felipe, eu como tio e único ser pensante na família estarei sempre ao seu lado. Peço ao nosso Grande Arquiteto que me permita sempre estar ao seu lado e que possamos lapidar juntos nossas imperfeições.

Felipe, um grande beijo do seu Tio;
Ana, parabéns cunhada;
Ricardo, até que dessa vez você acertou.

Mike Wevanne disse...

Toda saúde, sabedoria e sorte para o pequeno.

Unknown disse...

Que lindo!!!! Parabéns e mil felicidades pra família!

Unknown disse...

Parabéns Rob! Meu piá também se chama Felipe. Felicidades à todos!

Unknown disse...

Muito bom texto.

Pedro H. Araujo disse...

"E, exatamente às 12:12, minha vida ganhou pontuação."

Que frase, que texto, que emoção eu senti ao lê-lo. Parabéns ao novo papai!

Isaque Fontinele disse...

Parabéns Rob. Muita saúde pra sua família! :D

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